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Conversas à Mesa

Até já Leonel Até ao São Gabriel

 

 

 

 

 

 

 

Ontem Joachim Koerper e Leonel Pereira  fizeram o jantar juntos no Eleven para que o ex-chef do Panorama-Sheraton pudesse despedir-se de jornalistas e amigos.

Como gosto muito do Leonel como pessoa e como profissional, reservei o meu lugar para lhe desejar boa sorte, felicidades e combinar uma ida ao São Gabriel por volta de Abril para o entrevistar e provar a nova carta.

Do agradável jantar saliento um gel de gaspacho da entrada e o prato de porco preto alentejano (conforme lhe chama Joaquim Arnaut, o seu criador, uma vez que o nome porco de raça alentejana está reservado para os associados  da ACPA, com sede em Ourique). Secretos e  presa conviviam com um puré de aipo, apresentando-se esta última, para mim uma das melhores parte do porco, bem rosada.

 

 

 

 

 

 

 

 

Quanto a novidades. O Thai Garden vai passar para outro local do mesmo proprietátio, a menos de 1 km dali. Na carta do São Gabriel mantêm.se dois pratos emblemáticos: a quiche de queijo suíço, uma entrada, e o emincée de veau com batata rosti.

O resto da carta será função de dois vectores:  o primeiro, é a criatividade do Leonel Pereira, a segundo a clientela sobretudo centro-europeia que acorre a este restaurante. A minha curiosidade é justamente perceber como é que Leonel enfrenta este desafio. Resta ainda acrescentar que o chef é algarvio, mais propriamente almacilence, da freguesia onde se situa o São Gabriel.

 

Até já Leonel

Até ao São Gabriel

Os Lehman Brothers do supermercado ou a carne de cavalo na lasanha

O que puxa a carroça já lá está. Só falta o que é puxado.

Acho que não foi surpresa para ninguém. Quanto mais não fosse esta crise financeira e depois económica sacudiu-nos bem e abriu-nos os olhos para aquilo que podemos esperar do Estado. E Actividade Reguladora não é de certeza. Se não regulam os bancos por que razão regulariam as comidas e as indústrias gigantescas e poderosas que estão por trás deste mega mega negócio da aliementação? (A seguir vamos provavelmente perceber como nos andam a tratar da saúde).

Numa época em que tanto se fala em rastreabilidade e sustentabilidade, em que se dá protecção jurídica a milhares de produtos na Europa com base nessas características, em que a europeia EFSA as nacionais ASAE parecem ser tão diligentes, como é possível que haja produtos à venda nos supermercados cujos ingredientes não correspondem de todo aos mencionados nas fichas? Numa altura em que se proíbe a Dona Micas de mexer as tripas da tasca com colher de pau, como é possível que haja carne de cavalo onde devia haver vaca em milhões de embalagens de produtos congelados produzidos por grandes multinacionais?

Tal como no mundo da finança, também aqui a cadeia é muito extensa e complicada e, pelos vistos, mais financeira que alimentar. Empresas que compram a empresas que compram a empresas que compram a empresas até chegar aos cavalos romenos que, claro, todos nós visualizamos a puxar aquelas carroças ciganas dos cenários da Carmen.




Diria Magritte: Isto não é uma lasanha, é um produto financeiro


Dizer “eu bem avisei” que a comida processada é o diabo, e que as coisas devem ser é feitas em casa não adianta. A maioria das pessoas opta por este tipo de alimentos pelo preço e não pela comodidade. E essas pessoas não fazem nenhum pacto com o diabo quando compram uma lasanha da Findus, têm o direito de saber o que estão a comer. E também não me parece  que a visão optimista de que “afinal a carne de cavalo até é mais saudável do que a de vaca” e que se não consegues vencê-los junta-te a eles, adiante muito.

A lasanha é certamente o primeiro prato de muitos que por aí estão a ser servidos. Isto nos processados. Porque depois vêm os peixes de viveiro carregados de antibióticos e alimentados a farinhas dos próprios ou de carnes, os cereais transgénicos e todos os outros OGM.

 

Recomendo o artigo, muito interessante, como sempre, sobre esta temática de Carlos Alberto Dória, o sociólogo brasileiro: http://ebocalivre.blogspot.com.br/2013/02/sobre-cavalos-e-capitalistas.html

 

Fui feliz no portuense Astória

 

 

Através de uma janela de sacada, a vista da minha mesa enche-se com as flores brancas de uma enorme magnólia que dá a partida para a Avenida dos Aliados, banhada num sol de Inverno que transfigura o Porto. Sinto-me muito bem neste ambiente neo-clássico do restaurante Astória, no lindíssimo Palácio das Cardozas onde se aloja o Intercontinental do Porto. Neste local existiu um antigo convento dos Lóios (séc. XV), os frades cujo azul do hábito deu origem a um nome de cor, o azuloio. Destruído este edifício, é só no século XIX que a ordem começa a construção de um novo convento, mas o anticlericalismo liberal obriga à saída dos frades. A fachada é então aproveitada para um palácio construído com os dinheiros do «brasileiro» Cardozo, que por morte o deixa em herança à mulher e filhas, as tais de Cardozas.




 

Com os toldos amarelos vê-se o café Astória no fim dos anos 50






Foi este palácio que foi recente e sabiamente convertido em luxuoso hotel de cadeia internacional, cuja casa de jantar foi já o conhecido café Astória, com entrada pela Praça Almeida Garrett e cuja principal atracção era a comodidade das suas cadeiras. Eu confirmo, uma vez que o modelo foi mantido.



 

Pedro Sequeira na casa de jantar do Astória de traços neoclássicos. As cadeiras reproduzem as originais do café.




É aqui que o chef Pedro Sequeira, ex sous-chef na cozinha de Leonel Pereira do Panorama, exerce, e bem, o seu ofício. A sua carreira, começada na escola hoteleira de Coimbra, tem-se  processado em grandes hotéis, nomeadamente em vários Sheraton. Ainda jovem, não tem nenhum vedetismo, sabe perfeitamente pôr a sua inteligência ao serviço do serviço da cozinha e tem todas as condições para ter sucesso na via que quiser escolher. Digo-vos agora porquê.




 

 

 

 

 




Menu de degustação por 55 euros (5 pratos)

Amuse-bouche

Espaguete de chila com cogumelos do bosque e abóbora assada

Escalope de foie gras sauté, marmelo compotado e crumble de brioche

 

 

 

 

Quando me sentei à mesa do Astória tinha intenção de provar a ementa do dia por 10 euros, mas ao deparar com o menu de degustação de almoço por 55 euros mudei de ideias porque os pratos me agradaram. Consegui convencer o meu companheiro de almoço a comer o prato do dia que era salmão e a deixar-me provar o mesmo.

Em boa hora. Menu equilibrado em termos de sequência e quantidades. Depois do amuse, também oferecido no menu do dia, chegou um prato bem outonal com duas abóboras: espaguete de chila com cogumelos do bosque e abóbora assada. Muito boa combinação a da entrada do foie com aquela combinação de doce e ácido que só o marmelo sabe transmitir e que torna esta fruta tão preciosa. O crumble de brioche a fazer bem o seu papel em vestes mais leves. Talvez tenha sido esta apresentação do marmelo aquilo que mais me agradou em toda a refeição, nunca o tinha comido num ponto tão perfeito entre a acidez e o doce. E que bela combinação para o foie, que infelizmente não esteve à altura do marmelo.




 

 

 Risotto de amêijoas à portuguesa, garoupa cozinhada em água do mar e ar de coentros

 

 

 

 

Carré de borrego em crosta de figo, miga de tomate e espinafres salteados, molho de hortelã



 

 

Pudim marfim, crumble de pistácio e gelado de lúcia-lima

 



 

O risotto de amêijoas estava muito bem, a garoupa saudável e escorreita o ar de coentros um pormenor muitíssimo bem conseguido. No meu entender, o risotto não deveria ter aquele ligeiro toque de queijo, estava a mais. 

Bonito de se ver o carré de borrego combinou muito bem com o figo e desapontou com o clássico molho de hortelã.   

A sobremesa tinha a curiosidade do pudim numa belíssima forma de cilindro. Lá estava a eterna quennelle de gelado, mas este de Lúcia-lima é uma sobremesa por si só. Já o tinha experimentado na véspera numa bela ligação com o pudim de castanho e gostado.

Além de bem concebida, a ementa está bem redigida, explica e não complica, que é como deve ser.





 


  



O menu de 10 euros dá direito a prato principal fixo, bebida e café. Com 17,5 euros já compra o mesmo mais uma entrada ou sobremesa.

 

 

 

Mas vamos lá agora à ementa dos 10 euros. É uma proposta irrecusável. Além de poder almoçar numa casa de jantar agradabilíssima, com as mais-valias acima enumeradas, tem direito a amuse-boche, um prato principal fixo, que no meu dia era um bonito lombo de salmão com bons acompanhamentos vegetais em várias texturas, bebida (um copo de vinho, cerveja, água) e café. Já no menu de 17,5 euros tem ainda direito a uma entrada ou sobremesa, a escolher entre duas ou três da carta. Irrecusável, sem dúvida. Um detalhe importante, mas que constitui 20% do preço total: há que pagar um couvert de pão e manteiga por 2 euros. Não gostei deste pormenor que só vi na conta. Estando prevenido, torna-se aceitável.

 

O serviço é jovem e educado.

Comi bem, estive bem, gostei muito. Parabéns ao Pedro Sequeira que com os pés bem assentes na terra, consegue dar-nos um agrado. 


Obrigada ao Mário Cerdeira pela maior parte das fotos (as boas, claro).



 

 

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