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Conversas à Mesa

PROVE PORTUGAL LONDRES, OS CHEFS E O LEITÃO DA BAIRRADA

 

Na continuação do programa Prove Portugal, cuja coordenação José Bento dos Santos deixou, o Turismo de Portugal continua a promover a cozinha portuguesa através dos nossos chefs, desta vez em intercâmbio com outros países e cidades. Primeiro foi o Brasil, agora chegou a vez de Londres, sempre pela mão de Justin Ultee.

Participei num evento de promoção do bacalhau no Hotel do Bairro Alto, com a cozinha a cargo de Vasco Lello, numa espécie de “mano-a-mano” com o inglês Nigel Haworth, do Northcote (Lancashire). Vasco Lello criou um prato-montra de várias formas de confeccionar d iversas partes do bacalhau e promoveu ainda a ginjinha

O projecto funciona do seguinte modo: chefs e restaurantes ingleses e portugueses são convidados para fazerem a promoção da cozinha portuguesa em Londres e a promoção de Portugal junto de jornalistas ingleses. Viajam em comitiva, mais ou menos alargada. No Bairro Alto Hotel estava apenas o chef Nigel Haworth. Dos jornalistas, o mais relevante pareceu-me ser o simpaticíssimo Kevin Gould, do Guardian (http://www.theguardian.com/travel/2014/sep/20/foodie-traveller-portgual-pastel-de-nata), grande admirador do Algarve, onde até tem casa. Tive longa conversa com os dois e, curiosamente os dois em separado me referiram o quanto tinham ficado impressionados pelo almoço que tinham feito na véspera: leitão da Bairrada. O que nos leva para a velha questão de saber o que devemos promover, se a cozinha regional/tradicional, se a cozinha contemporânea. Esta é uma falsa questão. Parece-me evidente que uma sem a outra não fazem sentido.

Contudo, Portugal, ao contrário da maioria dos países/destinos gastronómicos, não tem um ou dois pratos de cozinha tradicional que o identifiquem aos olhos dos estrangeiros. Nem chefs que imediatamente venham à baila, como acontece em França, Espanha ou Brasil, embora o nosso José Avillez já tenha amealhado muito prestígio internacional.

 

 

 

 

 

 

 

 

Quando muito os estrangeiros referem o bacalhau quando se fala de cozinha portuguesa. Houve uma tentativa através de um outro projecto do Turismo de Portugal, o Cataplana Experience, para o qual fiz um livro homónimo. A cataplana tinha, e tem, todas as condições para se tornar um ícone da cozinha portuguesa, o projecto foi um êxito, mas o esforço para a sua promoção acabou por se diluir.

Parece-me essencial a promoção da cozinha contemporânea que, por seu lado, remete com frequência para as nossas raízes, mas devemos não esquecer que 99,9% da nossa oferta restaurativa é tradicional/regional. E que nesta vertente está uma riqueza e variedade que dificilmente se encontra noutros países.

É inegável que, actualmente, os rostos de promoção de uma cozinha são os chefs, com o seu mediatismo. Daí que esta capitalização do Turismo de Portugal na promoção da cozinha contemporânea faça todo o sentido, em projectos como o Prove Portugal Londres. Contudo, seria prioritário que, antes de se divulgar, houvesse matéria séria para divulgar. Que a nível interno, nacional e regional, se investisse seriamente nesta aliança da tradição e da contemporaneidade e na formação dos cozinheiros nesse sentido. Seria desejável a criação de receitas criativas que bebam na tradição, receitas essas que mereçam tornar-se clássicos da nossa cozinha, os nossos pratos bandeira a divulgar no estrangeiro. Não são tarefas que os chefs possam fazer sozinhos. São tarefas que implicam que estejamos todos a puxar para o mesmo lado, em conjunto, e isso obriga à existência de uma identidade que coordene e invista nesse esforço. E obriga sobretudo a que todos se unam para que todos saiam a ganhar.

NOVO LIVRO DE MARIA DE LOURDES MODESTO

Já está nas livrarias o último livro de Maria de Lourdes Modesto, Sabores com Histórias, publicado pela Oficina do Livro (grupo Leya). Reúne crónicas escritas para a imprensa, sempre complementadas por receitas e conselhos. A autora começa o livro dizendo que é ideal para ler no comboio, ou seja, que é um livro leve, de capítulos muito pequenos com os quais podemos conviver informalmente. Já as receitas não são para o pouca-terra, mas sim para guardar sempre à mão, na cozinha: ao contrário das presentes na maioria dos livros que enchem estantes e, quais revistas do Playboy, delas só vemos as fotografias, estas receitas não se destinam apenas ao olhar, mas são mesmo para experimentar.

Maria de Lourdes Modesto é cada vez mais a referência da cozinha portuguesa, e não só da cozinha familiar ou da cozinha tradicional, que a autora plasmou no mais famoso dos nossos livros, o Cozinha Tradicional Portuguesa. Também para a cozinha contemporânea, esta senhora permanece como o valor seguro, a tal guardiã do fogo onde os actuais chefs procuram ir acender a sua inspiração. Não foi por acaso que ontem no almoço de lançamento estiveram presentes vários chefs famosos, como José Avillez, Justa Nobre ou Vítor Sobral. Ou que os três pratos que constituíram a refeição foram executados por um jovem cozinheiro com programa na TV, Sebastião Castilho, que recriou outras tantas receitas do livro.

 

 

 

  

 

MLM afirmou ontem em entrevista à RTP que os verdadeiros guardiões da cozinha portuguesa (um termo polémico) são as famílias. Se no dia-a-dia não a cozinharmos, ela perde-se, torna-se apenas uma história para contar. Todos, e cada um de nós, somos responsáveis pela sobrevivência dos nossos pratos tradicionais, quotidianos ou de festa.

Num país onde a cozinha carece de referências, quer a nível nacional quer internacional, Maria de Lourdes Modesto é uma benção. Que da sua pena saiam muitos mais livros e ensinamentos, é o que eu desejo e peço. E que pena afinal não serem mesmos duas MLM como na foto acima....

 

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