Prémio para Inácio Loureiro em redor de um almoço
Foi em casa, na Fortaleza do Guincho, que, a 21 de Junho, o sommelier Inácio Loureiro recebeu em redor de um almoço o merecedíssimo prémio da Academia Internacional de Gastronomia, pela mão de José Bento dos Santos. Esteve sentado à minha direita, enquanto à minha frente, elegantíssimo na sua jaleca e charmosíssimo no seu francês alsaciano, se encontrava o restaurador e chef Antoine Westerman, 3 estrelas no Michelin para o seu Buerehiesel. Além de mais dois restaurantes em Paris, é também o consultor do Fortaleza. A completar a mesa de 11 pessoas, vários membros da Academia Portuguesa e dois jornalistas.
Mr. Antoine Wesserman ajudou na orientação do almoço.
Vou descrever esse almoço da autoria de Vincent Farges com duas ajudas preciosas, que muito agradeço. A do próprio Inácio Loureiro, que escreveu a parte sobre os vinhos que foram servidos, e a do fotógrafo Ricardo Veiga, que me deu uma óptima ajuda com as fotos que não são dos pratos.
Adorei os botões de punho do sommelier premiado, Inácio Loureiro.
Já aqui disse e pego nessa deixa para começar. Gosto muito da cozinha de Vincent Farges, do modo como ele combina os nossos produtos com as preciosas técnicas francesas que ele bem domina, da utilização que faz dos seres marinhos, que a proximidade, quase envolvência, do mar do Guincho, ajuda a relevar e ainda do modo como ele consegue aligeirar os pratos sem perder no sabor.
Começámos com uma hortinha trazida da Quinta do Poial com creme de foie gras fumado e lascas de culatello di Zibello. Com séculos de existência na região de Parma, o culatello é um presunto feito apenas de um músculo, uma espécie de lombinho da perna, ensacado em bexiga de porco e enguitado como o nosso lombo de Portalegre. A sua fama de ser o topo dos presuntos resulta também do clima da região, muito dado a névoas que criam uma humidade permanente. O fumado do foie gras trouxe a esta entrada o sabor característico a que estamos habituados no presunto.
Tartelete de legumes da Quinta do Poial
De seguida, nova entrada: Filete de salmonete assado com óleo de limão, legumes glaceados com cominhos e açafrão, molho avinagrado. [Servidas com o Billecart-Salmon Brut Reserve, um champagne harmonioso e equilibrado. O seu lote permanece inalterado desde 1945: uvas de três anos diferentes - Pinnot Noir, Chardonnay e Pinot Meunier - das melhores vinhas da Vallée de la Marne. Este cuvée destaca-se pela finura das suas bolhas. O aroma é maduro com frescura floral e notas de gengibre. Um ataque cheio no palato seguido por uma frescura perfeita e um bouquet rico.]
Filete de salmonete
Lindo na sua cauda púrpura de bispo chegou o lavagante assado com toranja, pequenos legumes da época e sucos de cozedura. Cozedura perfeita de 1 a 2 minutos para os seus cerca de 600 g, a que seguiu uma passagem no sauté de alguns segundos de cada lado. Os sabores cítricos, já presentes no prato anterior, tinham um pouco de amargor, mais visível no molho. [A acompanhar, o Guru 2010, um vinho da Região do Douro, produzido a partir das castas Viosinho, Rabigato, Codega do Larinho e Gouveio - vinha com 48 anos de idade integrada numa propriedade de apenas 2,5 hectares de vinha pertencente a um casal de pequenos produtores, mas enólogos bem conhecidos. É um vinho com carácter mineral evidente, madeira bem integrada e um fundo levemente cítrico, remetendo à lima e a notas herbáceas.]
O lavagante com toranja
Peito de pombo de Anjou
O vinho servido com o pombo.
Na carne, um dos meus favoritos desta carta: peito de Pombo de Anjou assado, refogado de legumes com amêndoas e tâmaras, coxas em pastilla com sultanas. Uma interpretação marroquina do Pombo muito bem conseguida e equilibrada. Heston Blumenthal faz uma receita semelhante a esta, mas com cereja, pistácio e cacau, embora no Fat Duck eu só tenha provado a ballotine. Estes pombos da região de Anjou não costumam ter mais de 28 dias quando entram na cozinha para este tipo de confecções.
[Triunvirato nº 2 é nome do tinto que acompanhou o pombo. É originário de um casa fundada em 1920, cujo produtor conta com a colaboração de um dos mais jovens e promissores enólogos portugueses para elaborar os vinhos das suas três propriedades. Este vinho foi criado loteando vinhos de 3 regiões diferentes, baseado nas castas Touriga Nacional do Douro (Quinta do Cachão), da
Bairrada (Qta. do Valdoeiro) e Dão (Qta. do Penedo), sendo que 40% do lote é também Syrah, da Quinta do Valdoeiro. Tem cor densa, aroma austero, com nuances minerais e notas químicas do tipo alcatrão, ameixa preta madura e especiarias. Paladar cheio, acidez que acompanha sempre a prova e final requintado e prolongado.]
Antes da sobremesa, a entrega do diploma de Sommelier do ano a Inácio Loureiro por José Bento dos Santos, em representação da Academia Internacional de Gastronomia.
As sobremesas e o Porto
Seguidamente, limpámos a boca com uma Nage de alperces em lúcia-lima fresca, pequenas madalenas e sorbet de iogurte e deliciámo-nos com Cerejas com kirsch, biscoito e cremoso de pistácio e gelado de kirsch velho da Alsácia. Inácio Loureiro presenteou-nos com o Niepoort Vintage 1997. [Desde 1842 que a família Niepoort produz vinhos do Porto, possuindo a melhor e mais diversificada matéria-prima, que obtêm através de antigos contratos com pequenos produtores a quem acompanham e tratam das vinhas: são mais de 700 parcelas de vinha, principalmente no Cima Corgo. No nariz, este vinho apresenta cerejas e amoras maduras (mas frescas) com madeira tostada. Na boca perdura até à eternidade, com tudo o que tivemos direito nos aromas, mas com sabores a uvas em passa, cerejas e anis, envoltos em veludo e taninos doces.]
Boa comida, óptima companhia e uma ocasião memorável, como esta entrega de um prémio justíssimo, tornaram este almoço inesquecível para mim.