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Conversas à Mesa

NO LANÇAMENTO DE SABORES DO AR E DO FOGO

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

O título deste livro é Sabores do Ar e do Fogo, mas não ficaria mal caso se chamasse Era uma vez os três porquinhos e o lobo mau. Efectivamente, os nossos três porquinhos autóctones, Prático (porco de raça alentejana), Heitor (o porco bísaro) e Cícero (o malhado de Alcobaça)  estão na base de toda a nossa salsicharia.  O terceiro está muito circunscrito,  mas quer o porco de raça alentejana, do tronco ibérico, quer o bísaro, do tronco celta, são porcos muito adaptados às respectivas  regiões e constituem matéria-prima de grande valia, responsável pela indiscutível qualidade dos enchidos, ensacados e presuntos que encontrei em todo o país ao longo deste trabalho.

 

 

 

 



 

 

 

A juntar-se à qualidade da matéria-prima suína, este livro fala também do saber-fazer das nossas gentes cuja paixão pela arte salsicheira permanece bem viva em todo o país, como tive oportunidade de constatar ao longo de dois anos em que não saí de fumeiros, sequeiros e câmaras de cura e até meti a mão na massa.






 

 

Nele encontrarão ainda um capítulo dedicado ao porco e às comidas da matança como referentes culturais, e um guia dos enchidos de todo o país. Mas este livro é sobretudo uma carta de amor ao porco. Penso que isso será o que mais ressalta na sua leitura.

 




 

 





 

Temos tesouros salsicheiros em todas as regiões, alguns produzidos em mínimas quantidades. Alguns são completamente desconhecidos fora da sua pequena zona de fabrico, como por exemplo a farinheira de sangue da serra de Monchique, no Algarve, o butelo transmontano ou a farinheira de batata alentejana.

Porém, se estamos então bem fornecidos em matéria porcina, como estamos de lobo mau?

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

O verdadeiro Lobo Mau da nossa salsicharia, o sopro que poderia provocar a sua destruição progressiva, seria a sua incapacidade de adaptação aos tempos modernos, em matéria de sabor e de saúde. A sua incapacidade de passar da necessidade de conservação ao culto do sabor. 

A nossa salsicharia adaptou-se no fim do século XVIII, princípios de XIX, à incorporação do pimento, sobretudo pelas suas qualidades anti-sépticas, que veio mudar completamente todos os nossos enchidos.

 

 

 

 

 

 

 

 

E até se adaptou à travessia do Atlântico para o Brasil:  foi com alguma emoção que travei conhecimento o mês passado no estado brasileiro do Rio Grande do Norte com a chamada chouriça, que podem ver nesta fotografia. Trata-se de uma morcela, leva sangue de porco, castanha-de-caju em vez de amêndoa e leite de coco em vez de vinho ou água. E em vez da tripa, a característica latinha do Nordeste, região  notória pelo aproveitamento de latinhas e garrafinhas.

 

Numa época em que em todo o mundo os enchidos e presuntos estão na moda, em que os próprios chefs os fazem nos seus restaurantes, dando-lhes o seu toque pessoal, como este pequeno fumeiro que encontrei sob a escada do restaurante The Clover Club, em Londres, 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

será talvez oportuno pararmos para reflectir um pouco sobre o papel que a salsicharia portuguesa pode ter no mundo. O meu desejo é que este livro possa de alguma forma ser útil  para esse debate.

 

Para comprovar que a nossa salsicharia pode estar presente no mais alto nível em mesas tradicionais e regionais ou em restaurantes com estrela Michelin pedi a colaboração de dois grandes chefs José Júlio Vintém e de Vítor Matos.

 

 

Vintém, actualmente residente no Recife onde tem um restaurante (Sardinha) preparou deliciosos pratos tradicionais, como este laburdo das matanças, alguns com apresentação moderna.

 

 

 

 






Vítor Matos (casa da Calçada, Amarante) elevou os enchidos à categoria de produtos de eleição em pratos de recorte moderníssimo como esta sua magnífica recriação do sarrabulho (peito de galinha enrolado em sarrabulho e trufa e cozido em caldo de carnes; espuma do caldo; esferificação inversa de sarrabulho, tiras de toucinho de bísaro)

 


 

 

 

 

 

 

 

 

 

 





 

Num universo tão vasto como o da nossa salsicharia há que escolher os produtos mais adequados para fazer essa promoção, há que ser criterioso na escolha do que se deve promover interna ou externamente.

Temos produtos, como os que foram experimentados no lançamento deste livro que ultrapassaram inequívoca definitivamente a prova da passagem da necessidade da conservação ao culto do sabor. Trata-se por exemplo do presunto e enchidos de Barrancos (Barrancarnes, Casa do Porco Preto) e da Bísaro (Gimonde, Trás-os-Montes). Assim queiramos, que temos todas as condições.

O meu obrigada a todos que trabalharam para este livro, em especial ao meu amigo Mário Cerdeira.






 

 

 

E os chefs, o que comem?









Sempre admirei os Romanos porque sendo muito dados a excessos em determinadas ocasiões, comiam muito frugalmente no dia-a-dia. A alimentação não tem de ser igual todos os dias, nem deve haver códigos pré-estabelecidos para aquilo que podemos ou devemos comer em determinado local ou em determinada altura.

Nas antigas brigadas de cozinha havia um elemento, o Família, que só cozinhava para o pessoal. Nos grandes restaurantes continua a fazer-se comida para toda a cozinha. E não se tratam nada mal.

Quando me convidaram para um barbecue ao ar livre na Fortaleza do Guincho para comemorar a Rota das Estrelas achei uma óptima ideia por várias razões. Primeiro pelas razões acima aduzidas. Segundo, porque desta forma teria a oportunidade de conversar com os chefs que participavam na Rota das Estrelas, um evento que reúne rotativamente os chefes portugueses estrelados nos respectivos restaurantes, sendo o elenco enriquecido com convidados estrangeiros.








Vincent Farges, o chef residente, fez uma refeição simples, com tudo aquilo que os chefs, e claro, todos os que não o são, gostam. Uma panóplia de bons produtos portugueses grelhados. O nosso peixe, desde o bacalhau ao lírio, passando pela sardinha. Os nossos enchidos, chouriças e farinheiras. E os pães maravilhosos do Fortaleza. Tudo complementado com pequenos mimos, como ostras e minilegumes. Conversei longamente com dois dos convidados, o inglês Adam Simmonds, da magnífica Danesfield House, perto de Londres, que conheci pessoalmente precisamente há 4 anos numas miniférias que aí fiz, e com Michel Van der Kroft, um holandês também estrelado.



Adam Simmonds (Danesfield House), Kiko Moya (L'Escaleta) e Michel Van der Kroft ('t Nonnetje)


Os dois gabaram muito o nosso peixe, estavam encantados, o que me trouxe uma imensa felicidade. Ambos salientaram a importância do produto local na actual cozinha, uma linha neste momento mainstream. O chef inglês confessou que não gosta de comer peixe ainda com espinhas, daí a sua dificuldade em apreciar a sardinha. Falámos ainda da actual cozinha inglesa e do longo caminho que esta tem percorrido e do caso particular dos pubs. Hoje, o inglês não vai tanto ao pub beber a cervejola antes do jantar  e meter o dente numa pie; hoje a tendência é ir ao pub almoçar ou jantar. Por isso a oferta mudou muito, mas dos pubs ingleses falarei em breve num post.   










Há muito tempo que não comia um clafoutis de cerejas. 





Iniciativa interessante esta da Fortaleza. Parabéns à Petra, ao Vincent e à Ana Músico. Gostei muito. Gosto sempre muito de ir ao Fortaleza. 




 

O Miguel Gameiro está a fazer estágio na cozinha de Vincent Farges e animou o almoço com as suas canções

THE CLOVE CLUB: BOLD BALANCES IN EAST LONDON

 

My table was located right in front of the kitchen's frontline. Five or six British lads, all very young, moved in a calm and pleased way, under the vigilant eye of a thirtyish beautiful chef who helps here and there, filleting the mackerel, ficelling the lamb fillets or cutting the lard. 







 







In a side table, one of the lads was shelling emerald green peas, sorting out the smaller from the slightly bigger, as "they don't all have the same cooking time". Simultaneously, he kept an eye on the small red timer that reminded him of rolling the sour bread dough that he transforms everyday in several 700 g beautiful loaves. So tasteful I could come here just for the bread and butter. 






 


 

 

I am having lunch in the recently opened The Clover Club, in the East Side, headed by Scottish Isaac McHale. The chef being absent in that day left the restaurant under the command of next in line, Tim Spedding, English born. Both of them are ex-The Lederbury and recently had a celebrated Pop Up.






 



 







 

Shoreditch, the restaurant area, is located in the londonian East Side, an old area where recently bloomed modern corporate buildings of IT (information Technology). These brought along hordes of young people, responsible for new venues in the Food business.

If you plan flowing my advice and go to The Clove Club, take advantage of the morning to make an exploratory walk both of the old and new sections, around Old Street and Liverpool Street. This area has the world bigger concentration of purple hair per square foot.

A parte velha em redor de Old Street

 

 


 

                  The new IT part, around Liverpool Street





 

 




 

 Purple and more purple


 



 

 

 

 







The Paper Dress (here) is a must to visit, to buy or simply breeze through vintage second hand clothes, eyeglasses, purses, or simply to have a very aromatic espresso at the counter.

Further down the same street (Curtain Road), one can rent a bike and cycle around like the locals do. Go see the graffiti by world famous grafitter Banksy, coveted by collectors all over the world. In the Cargo Beer Garden (Rivington Street) it is possible to see His Master's Voice, a famous Banksy piece. (If you are interested in the graffiti, see here.) Banksy success led the building owners to commission grafitters to cover their own walls!

 

 

 

 

 


Banksy

 




This is The Clover Club’s environment. The restaurant is located in a beautiful neoclassical building, the old Townhouse, where between 1955 and 1975 took place boxing combats and where took place the first TV in England and where today many events occur.










The decoration is simple, high and low tables in warm wood, almost monastic with the exception of the attractive art deco bar, home to the mise en scène of many cocktails, entitled to a special menu. The service is courteous, well humoured and relaxed, as it should. 














Let’s start with the menu analysis than. Lunch time, one can choose à la carte, with specials everyday, or a Set Menu, which was my choice, in order to broaden the tasting dishes. A first glance shows that, besides the season produce, the meal’s structure is based on british ingredients, such the braised mackerel, the lamb, the Cheddar, the charcuterie and the vegetables (cucumber, leek, peas, mint). All politically correct, plus the existence of a vegetable garden in the premises.

 

 



 

 






 

 

 

 

My head, heart and stomach are immediately won over by two simple breakfast radishes, spiced qb, with a gochuchang sauce (a Korean condiment) and black sesame seeds. Simultaineously, came a sort of chicken nugget, previously marinated in buttermilk e fried, nothing I ravished about. The last appetizer, a well-seasoned pigeon sausage, came with ketchup in the Ten Bells pub, another Isaac’s premise. I was thrilled to see charcuterie coming up strong.

 





To separate appetizers from main dishes, a multicoloured salad starring all spring vegetables raw or cooked on a brushstroke of ricotta and thin lard slices. I loved the incredible taste of the carrot and the miniscule garlic flowers. However, as the main dishes start to appear, accompanied by Tim’s comments, I start to grasp the balance and boldness of certain combinations. Mackerel, fished in the cold Cornwall seas was fresh, mild taste and correct. Braised, it married perfectly with the low profile cucumber, maybe because previously crushed and drained, with the dill sauce and elderflower vinegar.

 



 

 



My favourite came next. I love minimalist dishes that allow each ingredient to present itself in full perfection, unsurpassable, in a combination seen as unique and natural it is the case of this monochromatic Musselburgh Leeks, Jersey Royals and Keen’s Cheddar (artisanally produced with non pasteurized milk), with one or two pickled pearly onions. The leek’s variety is rustic and of generous size. It grows in Winter/Spring in Edinburgh region.

The tiny tiny potatoes, that I saw wash with utmost care, are from the jersey shore. The sea lends them a non-sweet taste, rather on the salty side, enhanced by the cooking in a seaweed broth. Pearly vinegar onions and cheddar give the dish the final zing. Perfect.

 




 

 


 The boldest dish was a faux sea-land. When I saw the lamb fillet in the company of several sea creatures, such as the anchovy sauce and the kelp I thought the animal was going to drown in all those marine flavours. I feared the worst. But, curiously enough, when I tried my first forkful where I piled all the ingredients, surprise. The first sensation was that all those sea elements were nothing but a seasoning to the lamb, that in the emerged in all its strength.

I loved that challenge, bold and a winner, in part because the lamb has strong flavour, nothing of the lactant kind. Tim told me about the passion for anchovy that the garum spreading Romans left in the British Islands. 

 

 

 

 

 








 

Desserts: simple but pleasant. The first, strawberries with cream, the second, more interesting, prunes with prune kernel ice cream.

To finish, two very English mignardises. Bah. A teacake and a Fernet drop, a drink that subsumes the entire herb drinks of the world…



 

 

 








In the end, Tim took me to their smokehouse, full of hams, coppa, salami and pork bellies. Wonderful all that charcuterie that I tried later with some more of the bread.

The Clover Club is one of those places where I could eat everyday.  I will come back.

 

 

Lunch set menu: £47

 

 

380 Old Street

Shoreditch Town Hall

+44 (0) 20 7729 6496

hello@thecloveclub.com

London 

Old Street  Subway Station (black line) or bus 55 (from Oxford Circle) and 243 (from Waterloo Station)

 

 

 

 

 

 

With Tim Spedding




Preço do menu de degustação de almoço: £47

 

380 Old Street

Shoreditch Town Hall

+44 (0) 20 7729 6496

hello@thecloveclub.com

Londres

Estação de metro Old Street (linha preta) ou autocarro 55 (de Oxford Circle) e 243 (de Waterloo Station)

The Clove Club: Equilíbrios ousados em East London

 

Estou sentada numa mesa mesmo em frente da cozinha. Cinco ou seis lads, todos british,  todos muito jovens, movimentam-se de forma calma e pausada sob o olhar do mais velho que dá uma ajuda aqui, a ficelar os lombinhos de cordeiro, ali a cortar enchidos, além, a filetar e amanhar a cavala.








Numa das mesas, um dos rapazes descasca ervilhas verde-esmeralda e separa-as por tamanhos com microns de diferença, “porque não têm todas o mesmo tempo de cozedura”. Ao mesmo tempo tem o olho num pequeno temporizador vermelho que marca o tempo do pão: sourbread feito com um fermento nascido uma semana antes da abertura do restaurante e sempre alimentado desde aí, qual tamagochi a requerer constantemente a atenção. Quando o alarme toca, dá-lhe mais uma boa amassadela, antes de moldar vários pães com cerca de 700 g cada.  Tão saboroso que eu voltava aqui todos os dias só pelo pão com manteiga.



 


 

Numa pequena estadia em Londres, escolhi para almoçar o recém aberto (3 meses) The Clove Club, um restaurante em Shoreditch do East Side de Londres chefiado pelo escocês Isaac McHale. No dia em que lá fui, Isaac estava ausente, substituído pelo simpaticíssimo Tim Spedding, ambos originários do The Ledbury com passagem por um celebrado Pop up).




 




 


 

 
A parte velha em redor de Old Street

 

 


 

                  A parte nova da IT, em redor de Liverpool Street






Shoreditch, a área do restaurante, fica no East Side londrino, uma zona muito antiga onde cresceram recentemente moderníssimos edifícios de grandes empresas na área da Tecnologia da Informação (IT). Estas trouxeram consigo uma legião de jovens responsáveis por grandes transformações em termos restaurativos. A ida ao Clove Club pode ser complementada por uma bela passeata exploratória que inclua a parte antiga e moderna deste bairro, centrado em torno de Old Street e Liverpool Street. Esta zona tem a maior concentração de cabelos roxos por metro quadrado do mundo.





 

 Roxo e mais roxo


 



 

 

 

 



















The Paper Dress é uma loja a visitar para ver ou comprar roupa em segunda mão de marca e sem marca, óculos, carteiras, tudo vintage, ou simplesmente para tomar um bom expresso ao balcão. Mais abaixo, na mesma rua, é possível alugar uma bicicleta e pedalar pelas ruas como fazem muitos locais. Aproveite a pedalada para ver os graffiti do já famoso Banksy, cobiçado por coleccionadores de todo o mundo, e outros. No Cargo Beer Garden (Rivington Street), existe uma peça conhecida, o His Master's Voice. (Se estiver interessado nos graffiti veja aqui.) O sucesso de Banksy e outros levou a que alguns proprietários de prédios contratassem grafitters para lhes cobrirem as paredes.



Banksy

 

É neste ambiente que fica o The Clove Club, situado num lindíssimo edifício neoclássico, a antiga Townhouse, num local onde se fizeram combates de boxe entre 1955 e 1975 (daqui  se fez a primeira transmissão televisiva ao vivo em Inglaterra) e onde hoje têm lugar diversos eventos.








Decoração simples, quase monástica não fossem alguns detalhes, mesas altas e baixas de bela madeira e um chamativo bar art déco, que quebra o minimalismo, onde se preparam um bom número cocktails com direito a carta própria. O pessoal de mesa é simpático, bem humorado e descontraído.











Mas vamos então à análise da ementa. Hora de almoço pode escolher-se à carta, variando sempre os pratos do dia, mas também está disponível  o Set Menu, de degustação, que é a minha escolha para alargar o campo de prova. Uma primeira leitura da ementa mostra que, além dos produtos da época, a estrutura da refeição assentava em produtos tipicamente ingleses, como a cavala, o cordeiro, o Cheddar, a charcutaria e legumes como o pepino, o alho-francês, a hortelã. Numa primeira abordagem, tudo politicamente correcto, ainda complementado pela presença de uma horta no local. 




 

 






 

 



A abrir, conquistam-me de imediato o coração, a cabeça e o estômago dois rabanetes (variedade breakfast) no ponto do apimentado, com um molho de gochuchang, um condimento coreano, e sementes de sésamo pretas. Em simultâneo, uma espécie de nugget de galinha marinada em buttermilk e frita, ao qual não achei qualquer valor acrescentado.  A última entrada, uma picante e bem temperada salsicha de pombo com um ketchup preparado no pub Ten Bells (também de Isaac), foi do meu especial agrado, também por ver os enchidos na ordem do dia. 

 






Para intervalar entre as entradas e os pratos principais, uma belíssima salada reunindo todos os legumes primaveris crus ou cozidos sobre uma pinceladela de ricota e finas tiras de toucinho. Destaco o incrível sabor da cenoura cozida e das florinhas de alho. O ovo é de faisão.

Porém, é à medida que vêm os pratos principais, e os respectivos esclarecimentos fornecidos pelo próprio Tim ou pelo pessoal da mesa, que me vou apercebendo da originalidade e da ousadia de certas combinações.

A cavala, pescada nos mares frios da Cornualha, foi arranjada na hora, estava fresquíssima, sabor suave e bom grau de cozedura. Braseada, combinava na perfeição com o pepino muito discreto, talvez por ter sido previamente esmagado e escorrido, e com o molho de endro e o vinagre de flor de sabugueiro.

 



 

 




 

O meu preferido veio a seguir. Cada vez gosto mais de pratos minimalistas em que cada ingrediente se apresenta na perfeição máxima, inultrapassável, numa combinação que surge como única e natural. É o caso deste monocromático Alho-francês de Musselburgh com batatinhas royals de Jersey, cebolinhas avinagradas e molho de queijo Cheddar de Keens ( feito artesanalmente por esta família com leite não pasteurizado). O alho-francês, uma variedade rústica e de tamanho generoso de inverno/primavera é da região de Edimburgo. As minúsculas batatinhas, que vi escovar uma a uma com todo o carinho, são da costa de Jersey. O mar dá-lhe o sabor não-adocicado, levemente salgado até, que a cozedura com algas reforça subtilmente. A cebolinha avinagrada e o molho de queijo Cheddar dão-lhe o zing. Declinei a trufa de Verão. Perfeito. 




 

 


 

 

 

 

 A maior ousadia veio sob a forma de um falso terra-mar. Quando chega o lombo de cordeiro acompanhado por molho de anchovas, espinafres e kelp achei que o animal terrestre ia morrer afogado nos sabores marinhos. Temi o pior. Mas, surpresa, quando meti a primeira garfada à boca onde propositadamente empilhei toda a variedade existente no prato, a primeira sensação foi que todos aqueles elementos marinhos se limitavam a ser um tempero da carne, que logo seguidamente saía a ganhar. Gostei deste desafio, ultrapassado também porque o ovino tinha sabor intenso, nada lactante. Tim fala-me do gosto pela anchova deixado nas Ilhas pelos Romanos, que espalharam garum por todo o lado. É ousado e bem conseguido.

 

 

 

 

 












Sobremesas: simples mas agradáveis. A primeira, morangos com crocantes e natas, a segunda, mais interessante, com ameixas secas com um gelado feito à base do próprio caroço da fruta.

Para acabar, duas mignardises muito inglesas. Um teacake, espécie de bomboka, e um drop à base de Fernet, uma bebida que quase todas as ervas do mundo. Bah.



 

 

 








 

No fim, Tim levou-me a conhecer o pequeno "fumeiro" do restaurante com presuntos, barrigas de porco, salames e coppas. Admiráveis enchidos que provei mais tarde com mais daquele saboroso pão.

 

The Clover Club era um daqueles sítios onde eu podia comer todos os dias. Caso pudesse, claro. Mas hei-de voltar.

 

 

 

 

 





Preço do menu de degustação de almoço: £47

 

380 Old Street

Shoreditch Town Hall

+44 (0) 20 7729 6496

hello@thecloveclub.com

Londres

Estação de metro Old Street (linha preta) ou autocarro 55 (de Oxford Circle) e 243 (de Waterloo Station)

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