O São Gabriel faz parte de um conjunto de restaurantes na região da Quinta do Lago/Vale de Lobo muito frequentada por estrangeiros e portugueses de capacidade financeira média/alta. Nessa pequena área, ou num raio de um punhado de quilómetros, concentram-se a maioria dos restaurantes portugueses com estrela Michelin e similares.
Situado numa vivenda com um agradável e luxuriante jardim, o São Gabriel é ideal para desfrutar das magníficas noites de Verão sem vento que o Sul nos proporciona.
Quando, em fins de Julho, fui ao São Gabriel, já sob a chefia de Leonel Pereira, ex Panorama/Sheraton de Lisboa, as mesas estavam todas ocupadas na sua maioria por estrangeiros, a fazerem as suas refeições familiares à carta, vendo-se poucos menus de degustação. Eu fui com a família e amigos e também comemos à carta, embora o chef nos tenha gentilmente oferecido algumas entradas e variados amuse-bouche.
Tinha curiosidade em perceber como a saída de um restaurante de hotel e, sobretudo, a ida para a sua terra de origem, o Algarve, tinham influenciado a cozinha de Leonel Pereira, um cozinheiro criativo, mas com os pés bem assentes na terra. Na refeição que lá comi, passeei entre o Algarve do Barrocal e o da costa, numa viagem sofisticada de imagens e de sabores.
Gostei muito de todos os amuse-bouche e das entradas que comi. Mais do que nos pratos principais, é aí que Leonel melhor dá asas à sua criatividade. Saliento dois, ambos relacionados com métodos de conservação muito usados no Algarve. Lima com ceviche de vieira e guacamole, de que gostei pelo equilíbrio perfeito dos sabores, nomeadamente pelo uso correctíssimo do acidulado da lima em parelha com o adocicado fresco do guacamole. Na língua são estimulados todos os centros do doce, do ácido e até do amargo, numa conjugação muito bem pensada. Depois, o Ria Formosa: sobre uma folha de carabineiro alinham-se como soldadinhos os minúsculos camarões secos da ria, ladeados por uma pinça de lavagante seca, um minúsculo souflê de plâncton e um tubo de pasta que ainda mais reforça o sabor do camarão. Aqui, o que atrai não é o fresco gosto do mar, mas a concentração de sabor proporcionado pela secagem, reforçada pela repetição dos sabores quase até à exaustão. Lembra-me um Algarve diferente, dos tempos antigos, em que a conservação dos produtos do mar passava, a curto prazo, pela acidificação dos alimados, para onde remete a entrada da lima e da vieira, e a longo prazo, pela salga e secagem dos produtos do mar, representada pela entrada Ria Formosa. Aqui encontrei as raízes do Leonel plasmadas de forma criativa, sendo que a entrada Ria Formosa faz juz à beleza desta mesma ria. Notável neste prato o minimalismo da cor.
Sardinha e cavala em duas confecções sobre gaspacho de pimentos foi a entrada que provei e gostei muito, tanto do ponto de vista estético da combinacao das cores como da harmonia dos ingredientes locais. Dois peixes da costa algarvia bem casados com tomate e pimento que antigamente os camponeses do Barrocal cultivavam nas hortas à beira-mar (vide Praia dos Tomates, em Vilamoura).
Depois vieram os pratos principais, os que menos me impressionaram. Robalo com xerém de amêijoas, espinafres e jus de coentro, Lombo de bacalhau cozido a baixa temperatura com musse de grão, Risotto de lavagante azul com salicórnias e suflê de plâncton e ainda Emincé de vitela Zurichoise foram os pratos que experimentei. Este último é um clássico da carta do restaurante que, à semelhança da entrada de quiche, é muito requisitada pelos clientes habituais. O risotto é um clássico do chef, todos eles correctos nos ingredientes e nas combinações.
Das sobremesas e mignardises, recordo-me especialmente da sopa de cereja e dos mini abade de Priscos.
Uma palavra de agradecimento ao Leonel pela surpresa que me fez ao fazer surgir magicamente um delicioso bolo de aniversário com velas e tudo. Outra para o serviço, de grande simpatia, embora ainda pouco entrosado com a cozinha. As maiores felicidades para o Leonel Pereira no lindo espaço do São Gabriel. Espero puder lá ir em breve, provar a carta de Outono.