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Conversas à Mesa

SEMEAR SABOR, COLHER MEMÓRIAS - O LANÇAMENTO

 

Para vos abrir o apetite para o nosso livro, aqui fica este vídeo e a minha fala no lançamento de ontem:

 

Para mim, este livro que hoje vos apresentamos é um livro de afectos e este lançamento também é de afectos, certamente inspirada na visita de ontem do nosso Presidente da República à nossa sessão de autógrafos na Feira do Livro. Pela primeira vez na minha vida, resolvi dedicar um livro, e logo com uma dedicatória dupla: à minha mãe e à minha neta que vai nascer em Outubro porque este é um livro dedicado à passagem da tradição na cozinha. E essa passagem era, na época em que recebi o testemunho da minha mãe, uma aprendizagem rodeada de afectos, que eu desejo muito repetir com a minha neta.

Nesse tempo, a tradição era algo que se passava de geração em geração de mãe para filha, de avó para neta. Embora eu tenha perdido os meus pais ainda jovem, consegui aprender muito com a minha mãe, sobretudo o respeito que se deve ter por todos os produtos que usamos na cozinha, nem que seja uma simples cenoura. A minha mãe era muito curiosa na cozinha e gostava de estudar certos alimentos. Fazia ciclos dedicados a um determinado produto, que cozinhava até à exaustão. A exaustão do produto e a exaustão da família toda, diga-se de passagem. Ainda hoje me lembro perfeitamente do ciclo da cenoura, que tanto entrava em doces como em salgados, parecia que de repente toda a comida era cor de laranja. Ele era pudins, ele era bolos e soufflés, pastéis, cremes e recheios; elas eram cozidas, estufadas, guisadas e assadas, ao pequeno-almoço, ao almoço e ao jantar. Do ciclo da confecção do peixe, recordo a tortura que era o linguado cozido. Infelizmente o linguado cozido tinha vindo para ficar e tornou-se recorrente lá em casa mas que foi o primeiro prato a banir assim que me tornei autónoma na minha cozinha.

 

Foi com a minha mãe que aprendi a cozinhar o que sei, que a tradição passou de uma geração para outra. Mas não posso de recordar o importante papel do Rodrigues, o nosso cozinheiro que lá permaneceu em casa mais de 20 anos e que tinha uma paciência de Jó para me aturar na cozinha. Era assim que se aprendia numa época em que grande parte das mães não trabalhava, e a cozinha doméstica era a capital do reino da mulher. Como inspiração, os livros de cozinha eram raros nessa altura, mas os que havia tornaram-se clássicos. Lembro-me perfeitamente do Isalita, do Pantagruel e do Tesouro das Cozinheiras, verdadeiras bíblias da minha mãe, que os anotava a lápis à margem, com comentários, tirando e acrescentando ingredientes. Ainda hoje estão em minha casa, juntamente com o clássico caderno de receitas escrito à mão, geralmente sem que estas tivessem qualquer ordem senão a do tempo: pudins na mesma página de croquetes e feijoadas ombreando com biscoitos.

Nos nossos dias tudo é diferente e foi-se tornando cada vez mais difícil prosseguir com a transmissão dos saberes desta forma. Com a entrada da mulher no mercado de trabalho, ficou pouco tempo para a cozinha, onde hoje coexistem com frequência homem e mulher. O homem geralmente com um objectivo mais criativo, a mulher mais focada em despachar a tarefa de alimentar a família com os conhecimentos que já domina, para poder passar rapidamente a outras tarefas domésticas. Porém, a falta de tempo para cozinhar e a necessidade de reduzir os preços com a alimentação levou muitas famílias a recorrerem a refeições congeladas ou pré-cozinhadas. Foram-se progressivamente perdendo os sabores e as memórias, sobretudo nos ambientes urbanos e suburbanos.

 

Hoje temos novos intervenientes neste processo de passagem do testemunho da tradição. São os profissionais da cozinha. São pessoas como a Justa Nobre, com raízes profundas na cozinha regional e vasta experiência e carinho pela restauração, que têm a responsabilidade acrescida de transmitir as receitas para as novas gerações. Atualmente, a maioria dos cozinheiros que pratica uma cozinha inspirada na tradição provém de meios rurais, onde ainda se preserva a cozinha regional. Contudo, esses meios rurais estão a tornar-se cada vez mais urbanos, e começam a perder-se os comeres tradicionais. Muitos jovens já foram criados a panadinhos e bolicaos e não têm memórias de sabores tradicionais que os possam inspirar na sua profissão, numa época em que a economia nacional se apoia cada vez mais no turismo, nomeadamente na gastronomia.

 

É por isso que este livro surge precisamente para se transformar num veículo de transmissão dos sabores e das memórias quer para as pessoas em geral, quer também para os profissionais ligados à restauração. O seu título, Semear Sabor, Colher Memórias, criado pelo Mário Cerdeira que também é responsável pelo conceito, remete precisamente para essa tarefa. O que a nossa equipa, constituída pela Justa Nobre, responsável pelas receitas, o Mário Cerdeira, resonsável ela fotografia e pelo food styling e por mim, responsável por todos os textos, se propôs fazer foi registar e preservar sabores e memórias da cozinha tradicional através das receitas originais e correctas e das histórias ligadas a essas mesmas receitas, para conhecimento das novas gerações. Adquirido o conhecimento, estará nas mãos delas transformá-la a tradição da forma que o coração lhes ditar. É para isso que ela serve, para nos inspirar a seguir em frente, mas conhecendo as nossas raízes.

O CIRCO DO PÃO

pão alentejano

 

 

Cada vez é mais dificil encontrar bom pão em Lisboa, apesar de tanta boutique do mesmo. Há-o com sementes de papoila, bagas de goji, espelta, nozes e uma variedade de outras coisas que parecem ter saído da pá do lixo depois de varrida a cozinha. Ou então os pães congelados, iguailitos em todo o lado, que uma hora depois de cozidos ficam emborrachados e sem sabor. Mas um bom pão de trigo, para fazer sanduíches ou para torradas, é mais raro que o lince da serra da Malcata. 

O meu pequeno-almoço continua inalterado desde sempre e consiste em torradas com manteiga e café, uma boa peça de fruta e um sumo de laranja. Não aprecio as tigelas de cereais, os keffirs, nem nada que seja doce. não me deixo tentar por buffets de hotel. Abro uma excepção nos EUA, para as panquecas, enquanto ainda tenho as horas trocadas, é tudo. 

Sou muito exigente com o pão. Gosto dele integral, mas também branco, sobretudo se for alentejano e tiver aquela densidade ideal para as torradas. Em muito lado se vende o pão mascarado de alentejano, como este do Corte Inglès, cheio de buracos e de textura leve, o oposto do orgiin, sem nada do original. Deixem de o vender com o nome de alentejano. Não nos enganem.

Se passarem no Torrão, não deixem de ir à padaria e abasteçam-se com vários pães de cabeça. As indicações estão aqui no blog

 

 

BELVEDERE ITALIANO

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Gosto de um bom restaurante italiano de quando em quando. Daqueles em que se come e massa como entrada e a proteína a seguir, só com um bom molho e legumes. Há um tempo que andava com vontade de experimentar o Belvedere, o italiano do Hotel Grande Real Villa Itália, situado no local onde habitou o Rei Umberto II de Itália durante a sua permanência em Portugal, na década de 1950. A ocasião surgiu quando vi uma promoção no Zomato: por 25 euros, o restaurante oferecia bebidas, uma entrada, um prato principal e sobremesa. Telefonei a reservar e mencionei a promoção, que era completamente ignorada por quem me atendeu. Pedi que se informassem e mantive a reserva para 4 pessoas ao jantar. Lá chegada, a confusão continuava. Quando me sentei à mesa, fui informada que me concederiam o preço da promoção, embora me aconselhassem a escolher à carta porque às vezes até ficava mais barato. Contudo, esta promoção ignorada pelo restaurante ainda hoje permanece na Zomato.

Bom, prossigamos então com a refeição, que foi regular, mas que não me deixou vontade de regressar.

Na mesa: pão, manteiga de tomate e de tinta de choco, salada de polvo e azeitonas. Tudo regular.

 

 

 

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Entrada: cogumelos, pancetta, beringela e tomate seco. Agradável mas sem história.

 

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Pratos principais: pedimos três saltimbocca de vitela à parmiggiana com beringela. A designação «parmiggiana» vem de «Parma», que significa um «escudo», ou seja algo que protege a comida. A minha expectativa era um escalope panado, habitualmente acompanhado com molho de tomate e, eventualmente uma cobertura de queijo derretido. Quando o prato chegou com três almofadinhas panadas ladeadas por um rectângulos de 2 cm por 7 cm de beringela, pensei que se tinham enganado no pedido. Após confirmação, confesso que me senti enganada. Não dava para perceber o que estava no interior da capa. Um prato pouco agradável. Um fraca interpretação livre da saltimbocca pelo cozinheiro.

 

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O quarto prato principal pedido consistiu em Tortellini de camarão, que, felizmente, vinham na sua forma expectável e correctos.

 

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Para sobremesa, um bom tiramisu e uma agradável mousse de chocolate

 

A sala de jantar é lindíssima, toda em brancos e azuis. No Verão abre para uma varanda, onde se pode comer. Contudo, deste belvedere não descortinei nada que lá me fizesse voltar.

 

 

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