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Conversas à Mesa

THE GREEN AFFAIR

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Foi o Nuno Hetfield, do blog vegan Alho-francês, que me convenceu a transpor a porta de um restaurante que exclui a proteína animal, ou seja, vegan. A minha (má) experiência no campo alternativo tinha cerca de 40 anos e reportava-se a um macrobiótico, onde tive a sensação de ser um passarinho numa gaiola alimentado a alpista.

Levou-me o Nuno ao The Green Affair, na zona do Saldanha, um restaurante vegan cujo conceito foi criado pelo Henrique Costa Pereira, com a ajuda preciosa do Alho-francês nas ementas. O espaço é lindíssimo e saí de lá com a convicção de que ali podia comer muitas vezes, sempre com prazer.

A grande surpresa para mim foi o sabor. Confesso que estava à espera de pouco consolo, mas praticamente tudo que comi estava carregado de sabores incríveis que me fizeram esquecer qualquer tipo de comparação com a comida a que estou habituada. O Green Affair é um local onde irei certamente mais vezes porque gostei da comida, e porque até um omnívoro como eu não precisa de comer constantemente proteína animal. O aspecto dos pratos é muito atraente, com a frescura e a cor dos legumes a contrastar com as das leguminosas e dos derivados de soja.

Achei curioso o facto de alguns pratos da carta ainda terem referências formais, linguísticas e estéticas, à cozinha omnívora (por exemplo à carne: o seitan, muito bom e feito no local, mima um bife, com a sua forma e cor) ou ao queijo (cheesecake é o nome de uma das sobremesas, sem que, evidentemente, lá exista cheese de qualidade alguma), ou ainda à crème fraîche.

Os meu pratos preferidos foram a couve-flor e o ceviche de palmito, de textura e sabor fantásticos. Gostaria aqui de chamar a atenção para a sobrexploração da palmeira juçara na Mata Atlântica para a retirada do palmito. Esta espécie está agora em extinção, tendo, de uma forma geral, sido substituída pela pupunha, de textura menos agradável, mas mais sustentável.

 

Há que provar um dos cocktails, muito cheios de fruta.

O que acho sempre mais fraco, são as sobremesas vegan: se a manteiga aceita ser substituída por abacate ou tâmaras, a pastelaria precisa de ovos e os resultados costumam ser insatisfatórios.

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Dois cocktails

 

 

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"Coxas" de Couve-Flor panadas e acompanhadas com molhos (Tártaro e Agridoce Picante)

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Tártaro de Beterraba com a nossa Pasta de Abacate

 

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Caril Katsu com Panados de Tofu, Beringela e Abóbora, Arroz e Salada

 

 

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Bowl de grão-de-bico com legumes da época

 

 

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Tofu marinado com Gratinado de Broa de Milho, Tomate e Coentros, Puré de Vegetal da Época e Salada

 

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A nossa receita secreta de Bife de Seitan com Molho de Pimenta, Gomos de Batata e Salada

 

 

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Crème brulée de coco com abacaxi assado

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Bolo de chocolate

 

The Green Affair

Avenida Duque de Ávila, 32 A, Lisboa

Aberto todos os dias, mas só para jantar

O ALMOÇO FAMILIAR DE DOMINGO

 

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Ir ao restaurante ao fim-de-semana é uma actividade comum dos portugueses, mas é difícil encontrar um restaurante onde o almoço de domingo possa ser do agrado de todos, reunindo comida tradicional e de conforto para os mais velhos e pratos com algum toque de modernidade para os mais novos. O restaurante Panorama, do hotel Sheraton, tem uma oferta muito original para o almoço de domingo. Nada de brunches, onde só acabamos por comer pão e outros farináceos, mas uma refeição farta inspirada na convivialidade e na partilha.

Fui recentemente convidada para experimentar o almoço de domingo do Panorama e saí de lá feliz, já eram quase cinco horas. Em primeiro lugar, uma das melhores vistas de Lisboa, com uma luz maravilhosa proporcionada pelas enormes vidraças. A comida assenta toda ela em sabores que nos são bem familiares, com vários e reconfortantes pratos de tacho e de forno. Para começar, uma vasta panóplia de entradas que vão chegando à mesa por vagas e que nos deliciam durante a primeira hora. Fiquei apaixonada pela bola de carnes em tamanho miniatura, talvez a melhor que já comi, logo a seguir à da minha avó...

 

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Algumas das entradas

 

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O gravad lax de salmão servido em carrinho

 

 

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A bola de carnes, de fazer salivar

 

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Saladinhas de verdes e de polvo

Na mesa, um bom pão, diversas pastas para o barrar, presunto e queijo, chouriço, azeitonas, frutos secos, saladas de verdes e de polvo, gravad lax de salmão De seguida, um delicioso arroz de tamboril e camarão e marisco seguido por um reconfortante pernil de porco bísaro assado com alecrim, mostarda e mel. Para rematar, diversas sobremesas, entre elas um soufflé de tangerina e Grand Marnier que remata o almoço com técnica perfeita.

Tudo servido com calma, sem qualquer pressão, e com profissionalismo e cortesia, a fim de podermos gozar a companhia.

O almoço custa 42 euros pp, com água e cafés, sendo que as crianças até aos 6 anos não pagam e entre os 7 e os 12 têm 50% de desconto.

 

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O pernil de porco bíaro com castanhas, puré de batata-doce, cogumelos, chalotas e couve-branca estufada com bacon.

 

 

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Pastel de nata, toucinho do céu, bolo de chocolate e fruta

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Aletria, parfait de chocolate branco, suspiros com ovos moles e frutos vermelhos. 

 

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Soufflé de tangerina

 

 

 

Fica ainda outra informação: O Panorama do Sheraton vai fazer jantar/ceia de Natal para as famílias a preço fixo. Aqui fica a ementa.

 

Para iniciar, diretamente na mesa

  • Presunto pata negra, requeijão de Seia, parfait de aves e foie gras, ceviche de carabineiro e lima, queijos nacionais, carapau alimados, azeitonas marinadas, compotas e chutneys caseiros, bola caseira no forno a lenha, cesto do padeiro
  • Salada de salmão fumado com espargos brancos e crumble de ovo
  • Salada de quinoa com camarão e couve kale com pera abacate

Clássicos de Consoada

  • Bacalhau cozido com todos azeite extra virgem e alho
  • Pernil de porco com mel e gengibre
  • Arroz de enchidos tradicionais no forno a lenha
  • Couves de Bruxelas salteadas com raspa de laranja
  • Batatinhas e castanhas assadas
  • Chipolata

Para Trinchar

  • Peru recheado com castanhas e frutos secos, molho de pão, molho cranberry e jus de peru

Delicias Natalícias

  • Bolo de chocolate, mousse de chocolate e framboesa com frutos vermelhos
  • Tronco de Natal de baunila e praliné
  • Bolo Rei
  • Pastéis de nata
  • Salame de chocolate
  • Aletria
  • Formigos
  • Rabanadas com açúcar, canela e vinho do Porto Towny
  • Arroz doce da avó
  • Broínhas de mel e nozes
  • Trifle de bonecos de gengigre e creme de baunilha com frutos vermelhos
  • Filhoses
  • Cup cakes (árvore de Natal , chapéus de Pai Natal de morango)

 

 

 

 

 

MAIS UMA VEZ A OSTRA

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O Estado Português, a partir do Ministério do Ambiente, tem neste momento um projeto de lei que eliminará 100% da produção nacional de ostra (crassostrea gigas ou ostra-do-pacífico) e truta (truta arco-íris) pois considera-as exóticas e invasoras. Depois do texto de Fernando Gonçalves, secretário- geral da APA (Associação Portuguesa de Aquacultores), neste post, Conversas à Mesa continua a alertar para este importante assunto através de uma entrevista a Rui Moreira, gerente da empresa Bivalvia, que cultiva ostras, e membro da direcção da APA. Antes de mais, salientemos o grande papel da ostra e dos bivalves em geral na filtragem das águas e, presentemente, na economia nacional. Em conjunto, a Crassostrea gigas e a truta arco-íris representam 15% da aquacultura nacional.

 

Conversas à Mesa – Que tipo de ostras são mais comuns em Portugal e na Europa?

Rui Moreira - Existem 3 espécies em Portugal, sendo que a produção nacional é apenas composta apenas em duas delas: crassostrea gigas e ostrea edulis.

A ostra japonesa (crassostrea gigas), originária do Japão e mais resistente que substituiu na produção a ostra portuguesa (Crassostrea angulata) nos anos 20 do século XX. Nos últimos anos, produzimos cerca de mil toneladas anuais mas este valor irá aumentar a partir de 2017/2018. Constitui hoje cerca de 99% da produção total de ostras em Portugal.

A ostra plana ou europeia (Ostrea edulis) é a mais rara e valiosa, mimosa e difícil de cultivar. Hoje, as quantidades produzidas são pequenas e, em Portugal, há apenas um ou dois produtores no Sado. Esta espécie teve um episódio de elevada mortalidade nos anos 20 do século XX, tendo sido em grande parte substituída pela mai resistente angulata (Crassostrea angulata), a tal portuguaise, que por aqui (Sado e Tejo) pululava e que seria certamente a base do consumo que os portugueses deste bivalve faziam no século XIX.

A ostra portuguesa (Crassostrea angulata) permitiu a Portugal entre os anos 20 e os anos 70 uma elevada exportação de ostra. Entre 1962 e 1971, chegámos a exportar sete mil e quinhentas toneladas de ostras, vindas das bacias do Tejo e do Sado e da Ria Formosa, parte da qual até ia de avião para França. Em seguida, na década de 70 do século passado, foi a vez do stock de angulata decair extraordinariamente em toda a Europa, devido a vários factores: poluição, tintas anti-vegetativas dos cascos das embarcações, contaminações por iridovirus. A gigas, que é uma ostra mais resistente, substituiu a produção de angulata em toda a Europa. Hoje, em Portugal, a angulata persiste apenas no canal de Alcácer do Sal e no rio Mira, que desagua em Vila Nova de Milfontes mas não permite gerar uma exploração comercial a nível empresarial.

 

CM – Quanto tempo demora a fazer uma ostra comercial?

RM- Cerca de dois anos em média, o que implica muito trabalho dos produtores durante todo o ciclo produtivo.

 

CM – Como está o consumo de ostra em Portugal?

RM – Tem vindo a subir bastante nos últimos anos e tem tendência para subir mais. O consumo de ostras em França é que está um pouco ameaçado porque as novas gerações preferem muitas vezes alternativas mais cómodas, como o camarão. Mas a França compra ostras à Europa toda e é um grande exportador para todo o mundo.

 

CM – Fale-nos do projecto de lei que está a ser preparado pelo nosso Ministério do Ambiente para que as ostras gigas sejam consideradas como exóticas.

RM – O problema é que o projecto de lei não as considera apenas como exóticas, mas também como invasoras. Que a ostra gigas seja considerada exótica, não discutimos. O tomate e o peru também são exóticos, vieram da América do Sul.

O problema é serem consideradas invasoras. Como sabemos, a tendência é eliminar essas espécies consideradas invasoras. Porém, o Ministério terá de provar que esta espécie é invasora. Cabe-lhes o ónus da prova, baseado em pareceres técnicos sólidos. Temos feito contactos com outros ministérios, como o da Economia e do Mar, uma vez que este projecto terá de ser aprovado em Conselho de Ministros, mas não fomos recebidos pelos respectivos ministros. Se a gigas for considerada espécie invasora, os produtores terão dois anos para terminar a sua cultura.

 

CM – A ostra plana e a angulata são alternativas válidas à gigas?

RM – Não há alternativa de produção à gigas nem à truta arco-íris. Se acabar a gigas, acaba a produção de ostra e truta. Nem a plana nem a angulata são alternativas, porque não há bancos naturais de qualidade que assegurem a produção nacional de angulata. A plana é uma espécie muito sensível com requisitos de produção muito distintos e por isso atinge preços quatro vezes mais elevados que a gigas. Por outro lado, o banco natural do Canal de Alcácer está interdito porque está contaminado com cádmio e cobre. O cobre é o metal que torna as ostras mais ou menos esverdeadas, embora não haja legislação acerca de quantidades máximas de cobre. Em relação ao cádmio existe legislação, e foi esta que obrigou à interdição do canal em termos de ostras. Estes dois metais provêm, entre outras potenciais origens, de escorrências de antigas minas e da produção agrícola de uma grande extensão de terras que desagua no canal.

Diz-se que as angulata, ou portuguaises, são muito valorizadas em França. É uma ideia romântica, mas não é verdade. Vários produtores no passado exportaram a angulata para França e era desvalorizada pela sua forma e pela carne esverdeada pelo cobre. Para o consumidor é irrelevante se a ostra é uma Crassostrea gigas ou Crassostrea angulata. O que o consumidor quer é uma ostra bonita, bem formada e com carne saudável. Pelo contrário, os produtores franceses nem querem a angulata, têm medo que com ela se propague novamente o iridovirus.

 

CM - O que pretende a APA em relação ao projecto do Ministério do Ambiente de considerar a gigas como invasora?

RM – Pretendemos que nos reconheçam como players nesta matéria, que nos oiçam e que se sentem connosco à mesa como representantes do sector na fase inicial de qualquer processo legislativo. Neste caso especifico, o Estado Português terá de cumprir a legislação europeia que define as condições para poder considerar estas duas espécies, a Crassostrea gigas e a truta arco-íris, como invasoras. Estas espécies são produzidas em Portugal há dezenas de anos e não se regista qualquer sinal de que sejam invasoras.

 

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Viveiros de ostras na ria de Aveiro

 

 

 

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Uma ostra muito desejável: carnuda e com linda concha

 

 

 

PÃO À MESA

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O nome Pão à Mesa veio-lhe de uma época anterior em que se pretendia servir pratos da cozinha portuguesa com a presença do pão, que os há tantos e tão bons. Um dos meus preferido, acima de migas e açordas é toda a classe de sopas secas, que se podem fazer expressamente ou para aproveitar sobras. E a propósito de sobras, há tantos pratos de sobras que são melhores do que aqueles dos quais sobraram (estou a pensar na sopa seca de cozido e nas roupas velhas). Mas agora isso não vem à cena e tenho de retomar o fio à meada para dizer que o nome continua a fazer sentido no sentido em que o pão é um belo representante da cozinha portuguesa. E é cozinha portuguesa com muita técnica por trás que faz o chef deste restaurante, o José Lopes.

Fui convidada para jantar neste restaurante situado no segundo coração gastronómico de Lisboa, o Príncipe Real (o que significa um príncipe real? Há príncipes que não são reais?) e saí de lá feliz com a maior parte dos pratos que comi.

Para fazer jus ao nome da casa, um bom pão de trigo e uma boa broa de milho. Faz sempre falta, para além do azeite e das versões fantasia, que venha uma boa manteiga à mesa.

Gostei da primeira entrada que consistiu em quadradinhos de choco de textura perfeita que vêm à mesa num espeto e que aqui são flamejadas. A acompanhar, um puré com tinta de choco (um ratio demasiado desfavorável para o choco) e pão torrado, que não supria cabalmente a necessidade de algo mais estaladiço. Depois, o melhor prato da refeição: puré de abóbora assada com porco e castanhas. Cada elemento tinha sido alvo de várias técnicas e processos até chegar à mesa e o trabalho tinha mesmo valido a pena: o pernil de porco estava bem temperado e de consistência perfeita, as castanhas, memoráveis. Só um reparo: esta entrada é para ser comida à colher de uma tigela e não de garfo e faca, mas há que desfiar mais o porco. De certeza que pedirei sempre este prato quando voltar ao Pão à mesa. O peixe do dia com xerém e berbigão também estava bem, com o pampo fresquíssimo. Muito agradável.

A fechar, um pudim abade de priscos que não está bem conseguido e que acompanha com os já clássicos cítricos, uma vez que hoje se acha o pudim demasiado doce. Eu gosto dele bem feito e per se.

Uma refeição muito agradável em que se nota positivamente o esforço feito num bom conjunto de técnicas e de bons ingredientes que, conjugados, produzem um bom resultado final.

 

 

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 O chef José Lopes lança fogo ao choco.

 

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