A praia de fim-de-semana no Algarve também tem mais gente do que o habitual. Gente a mais. Por outro lado, não sei se isso vos acontece, mas chega uma altura das férias em que é necessário fazer um descanso do sol. Por essas duas razões, resolvi fazer uma folga à praia e experimentar o clássico almoço de domingo do S. Gabriel, o restaurante de Leonel Pereira em Almancil.
A ementa do almoço tem um preço fixo (34,00 euros), sendo divulgada nos dias anteriores. É um pouco falso este preço porque não inclui bebidas (um copo de vinho ronda os 10 euros, uma água grande, 5,50), nem couvert (4 euros cada) nem café (4 euros cada). E águas, vinho e cafés têm os preços habituais do restaurante com uma estrela Michelin.
O ambiente da esplanada é muito agradável, sobretudo se não estiver muito calor, o que não era o caso.
Há duas entradas, três pratos principais e duas sobremesas à escolha, constando o menu de uma entrada, um prato principal e uma sobremesa. Como ia acompanhada tive a possibilidade de experimentar as duas entradas, dois principais e as duas sobremesas: Gaspacho com cavala, Carpaccio de vaca, Bacalhau sobre legumes à brás e Borrego assado.
Esta refeição fez-me pensar como estes pratos que no princípio do século eram inovadores se tornaram hoje uns clássicos, incorporando-se na nossa tradição. De início, tive a sensação de estar perante uma refeição vintage, um déjà vu gritante, mas, após alguma reflexão, percebi que realmente estes pratos passaram a fazer parte da nossa tradição culinária. Fazem parte de alguns casos que em vez de simplesmente se desvanecerem, estes pratos ficaram vivos e dizem-nos alguma coisa, gostamos de os revisitar e passaram a fazer parte do acervo da nossa cozinha.
Tome-se o caso do Borrego desossado e prensado num tijolinho. Recordo-me de, em 2007, ter fotografado esta receita pela mão de Vítor Sobral para o meu primeiro livro, O Grande Livro dos Chefs. O medalhão de bacalhau (neste caso de meia cura) sobre brás de legumes, não me lembro já quantas vezes o comi no virar do século, assim como gaspacho com a cavala, geralmente esta do lado de fora da sopa (aqui servida a boiar, uma opção que me parece menos feliz), ou o carpaccio com as lascas de queijo e a rúcula. Todos os pratos tinham boa execução e matéria prima de qualidade.
Tudo isto me fez concluir que a nossa tradição culinária tem sido muito enriquecida nos últimos tempos através destas versoes modernas de pratos tardicionais, como o Borrego assado com batatinha ou o bacalhau de cozedura aprimorada pelas novas técnicas do sous vide.
Quanto ao «brás», voltarei a ele num próximo post.
E que há alturas em que nos apetece as versões mais antigas, outras em que nos sabem melhor as transformações modernas, aliadas a técnicas aperfeiçoadas.
Naquele domingo, souberam-me bem estas versões mais leves, mas de sabores concentrados e frescos. O almoço de Domingo de Leonel Pereira soube-me bem. porque se Leonel pode ser definido como experimentalista na cozinha, também é um cozinheiro de mão-cheia para pôr os nossos sabores tradicionais no prato. E mais, o chef estava a trabalhar na cozinha, e isso é muito louvável.
Aqui fica o testemunho fotográfico da refeição.
Gostei da manteiga de leite caramelizado (à dta)
Amuse-bouche: croquete de pézinhos de coentrada
Carpaccio com queijo e rúcula
Gaspacho com cavala ( a flor é de tinta de choco e não foi uma mais-valia)
Borrego (prensado) com puré de ervilhas, ervilhas-tortas, batatinhas e cenouras
Bacalhau de meia cura sobre brás
Babá de manga