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Conversas à Mesa

TARTE DE LIMÃO INFALÍVEL

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A tarte de limão merengada é fácil de fazer, mas deve seguir estes conselhos para que resulte em pleno. O grande problema costuma ser sempre a humidade que fica nas claras batidas em castelo que leva a que elas encolham enquanto vão deitando líquido. A receita da parte das claras é da Martha Stewart, que não costuma falhar. Eu comprovei.

 

1 pacote de massa quebrada redonda ou feita em casa

Pré-aqueça o forno a 180ºC. Forre uma forma de tarte de fundo amovível com a massa. Cubra com feijão seco ou com os pesos próprios para as tartes não enfolarem. Leve ao forno durante cerca de 20 minutos, ou até ficar dourada.

 

Recheio

250 g de açúcar

1 colher de sopa de farinha

4 chávenas de leite

100 g de farinha

4 gemas

Raspa de 3 limões, de preferência biológicos

 

Coloque todos os ingredientes num tacho e leve a lume médio, mexendo sempre com as varas, até engrossar. Coloque uma película plástica sobre o creme e leve ao frigorífico durante umas horas, ou de um dia para o outro.

 

Cobertura de merengue

6 claras XL

150 g de açúcar

1 colher de café de cremor tártaro

1 colher de café de farinha maisena

 

 

Numa taça bem limpa, deite as claras e o açúcar. Coloque em banho-maria sobre um tacho com água apenas a fervilhar. Coloque a taça sobre o tacho, tendo cuidado para o fundo não tocar na água. A intenção é dissolver o açúcar todo, de modo a que o merengue fique mais sólido e uniforme. Para ver se todo o açúcar está dissolvido, coloque e um pouco de claras entre os dedos, para sentir se ainda existem eventuais grãos de açúcar.

Bata as claras com o batedor eléctrico e junte o cremor tártaro. As claras devem formar picos bem firmes e ficarem brancas e brilhantes, mas não as bata demasiado, para não secarem. Adicione a maisena e bata para incorporar (o papel da maisena é absorver algum líquido que as claras possam ter).

 

 

MONTAGEM

Na hora de servir, deite o recheio de limão na massa e alise. Deite as claras às colheradas sobre o recheio, tendo o cuidado de o cobrir completamente. Em seguida, com as costas da colher abaixe as claras, de maneira a formarem picos. Em seguida, pode dourar as claras no grelhador do forno, mas a melhor técnica é usar o maçarico de cozinha. Desta forma, as claras não secam tanto nem deitam líquido. A tarte deve ser servida sem demora.

 

 

 

 

 

 

O DEDO MINDINHO

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Há coisas que se propagam com mais celeridade que a Covid19. Certas bengalas da língua, como o Então Vá ou o É Assim, parecem ter pernas para andar. Na restauração, e falo hoje da sala, também há «bengalas» do serviço que eclodem de norte a sul do país. Aqui há uns anos, houve uma que se tornou um clássico e se espalhou de tal forma que até parecia ser ensinada nas escolas de hotelaria. Trata-se do Boa Continuação, algo que os empregados de sala pareciam empenhados em perpetuar. Hoje noto outra tendência completamente absurda em inúmeros profissionais da sala: apontar para os vários elementos que compõem um prato com o dedo mindinho. Eu percebo a intenção, que será certamente minimizar a intrusão usando o dedinho mais pequenininho, mas não faz sentido nenhum. Para apontar, temos um dedo que até se chama indicador, aquele que indica. Se fazem muita questão em apontar, usem-no. O ideal seria que não apontassem, não há necessidade. Já passou a época das grandes descrições dos pratos, que até envolviam uma rigorosa propedêutica do modo como se devia abordar os ingredientes, que utensílios usar, o que se devia comer primeiro e por que ordem e até para que lado deviam ser obrigatoriamente mastigados.

Hoje, passámos daquela exaustão dos menus em que todos os elementos verticais das «camas» eram nomeados para ementas muito mais lacónicas, em que se nomeiam os três ingredientes principais. As composições também têm menos elementos e não vale a pena descrever o que contêm a gota cor de laranja com 3 mm de diâmetro que está no prato. Se o chef quiser muito que o cliente fique a conhecer profundamente todos os meandros de um rabanete, como foi fermentado ou marinado, onde nasceu e como foi criado, então coloquem essa informação na ementa.

Nesta época viral, seria interessante que a comunicação com o empregado de mesa, com a respectiva máscara, fosse reduzida, e que as ementas tivessem todas as informações relevantes. Deixem lá o dedo mindinho sossegado.

NA ESPLANADA DO ALBATROZ

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Boa comida e Albatroz nunca fizeram parte da mesma frase numa conversa. Sempre adorei ir ao fim da tarde tomar uma bebida ao Albatroz porque a vista é do outro mundo (andam-se milhares de quilómetros de avião, quando temos disto aqui mesmo em casa) e o terraço é polifacetado: tanto se vai para um momento zen de imersão na azulíssima paisagem como para ver gente e conviver. Mas confesso que a melhor coisa que me lembro de lá comer eram as amêndoas torradas que sempre foram óptimo pica-pica para o whisky ou o gin.

Hoje tudo mudou graças ao trabalho de Fréderic Breitenbucher. O novo chef do Albatroz é daqueles que cozinha para o cliente e não para o Instagram. Criou uma ementa abrangente para o terraço, com a preocupação de usar o que Portugal tem de melhor. Ostras ao natural ou com dois molhos levíssimos, bem-apresentadas em bandeja com gelo, limão e salicórnia (pessoalmente prefiro-as sempre como vieram ao mundo, sem qualquer adição, nem sequer cítrica) e amêijoas à Bulhão Pato (o toque final da manteiga dá-lhes graça, embora eu seja adepta do azeite, coentros e alho) para começar. Depois, uma salada César de frango ou de camarão, cheias de sabor com acidez. Não deixe de experimentar a versão sapateira recheada (parece que este ano a santola não anda grande coisa) do chef, com uma telha de açafrão e uma gelatina de fruta Ou para os mais gulosos, um Royal Cheese com um hambúrguer gigante encimado por um escalope de foie gras, cebola caramelizada trufada e queijo cheddar a escorrer. Uma experiência de verdadeira gula depois de os olhos se terem regalado com um festim de sabores, onde Fredéric incluiu os luxos do foie e da trufa, que elevam este pedaço de pornfood a outro nível. Para começar por achatar com as mãos e comer à mão sem fazer cerimónia com o foie. Por 26 euros, tem almoço e jantar...Com uma vantagem de poder partilhá-lo com quem se queixar das calorias: coma o hambúrguer todo e deixe o tronco de pepino com a alface enrolada para o queixoso. Boa ideia a do Fredéric de deixar o pepino de a alface de fora do hambúrguer, só a marcar a sua presença.

Para quem tem juízo e não cede aos prazeres da carne, há um prato do peixe do dia. Ontem era cherne com legumes da Quinta do Poial. O peixe imaculado, de frescura e confecção, a falar só de si próprio, como gosto. E como gosto mesmo é de comer primeiro os legumes e no fim o peixe, para o gozar totalmente sem misturas.  

Não esteja já a pensar que eu comi isto tudo a uma só refeição. Estava com mais dois amigos e partilhámos. Por isso ainda podemos terminar a refeição com o meu babá preferido de sempre: uma textura mais densa do que o clássico, a aguentar melhor a calda de rum, e um creme untuoso, mas fresco, no topo. E uma frutinha, por causa das vitaminas.

O vinho branco a copo foi o da «casa», um Chardonnay 2018 da Casa Santos Lima. E um tinto Do Douro lavradores de Feitoria.

Aos cascalenses que sempre gostaram do Albatroz, mas que já lá não iam ao tempo, aconselho-os a voltar. Tudo está perdoado. Comecem pelo terraço e depois tentem a sala de jantar, ao jantar (veja o post anterior a este sobre o jantar).  Albatroz e boa comida já convivem bem na mesma frase.

 

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Amêijoas à Bulhão Pato

 

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Ostras de Aveiro

 

 

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Sapateira

 

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Cherne com minilegumes da Quinta do Poial

 

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Salada César de camarão

 

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Royal Cheese com foie gras

 

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Babá au rhum com alperce

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Fruta laminada

PARABENS MARIA DE LOURDES MODESTO

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Hoje faz 90 anos a Maria de Lourdes Modesto. A grande paladina da cozinha regional e tradicional portuguesa, cuja defesa traduziu num livro que ficará para a história da nossa gastronomia como nenhum outro até hoje.

Generosa, sempre disposta a partilhar o seu saber sem qualquer arrogância, nunca mostrou tiques de prima-dona. Tive a felicidade de muito aprender com ela.

Apesar da sua defesa intransigente da cozinha tradicional, tornou-se a musa dos chefs da nossa cozinha contemporânea, que fizeram do seu livro a bíblia e se inspiraram nas suas receitas para recriarem a tradição. E a Maria de Lourdes teve sempre a generosidade de os apoiar, mesmo quando não concordava com as suas desconstruções, porque achava sempre proveitoso que eles fossem beber à tradição para que esta não se perdesse.

Houve outras mulheres na sua época que também saíram em defesa da cozinha regional e tradicional e que a glosaram em revistas e em magníficos livros. Mas nenhuma conseguiu ser tão completa quanto ela. A Maria de Lourdes tem um incrível poder de comunicação, escreve muito bem num estilo que é reconhecivelmente seu, sempre foi linda de morrer, tem uma enorme tenacidade e, last but not least, conhecimentos valiosos e infindáveis. Esse conjunto é imbatível.

Hoje comemorou o seu aniversário com meia dúzia de amigos dos quais me dá muito prazer fazer parte. Muitas e muitas conversas a duas ainda nos aguardam.

Parabéns Maria de Lourdes Modesto e obrigada.

 

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