SPOT ON
Eu sou um dos muitos cascalenses fiéis até à morte à praia do Guincho. Nunca pus pés em nenhuma outra aqui na zona de Lisboa, tirando uma vez que fui à outra banda. Faça vento ou ventania, nevoeiro ou frio de rachar, esteja a água a 15º (também pouco mais sobe), se é para ir à praia é para o Guincho. Se necessário, leva-se a manta lobeira ou o cobertor do tigre, mas vai-se. Infelizmente, aí pelos meus 13 ou 14 anos, cheguei a contribuir inconscientemente para a destruição das dunas para onde íamos andar a cavalo, a galope desenfreado.
A esplanada do SPOT em cima do mar e com optimas distâncias entre as mesas.
O chef Gil Fernandes
O mar do Guincho, pontilhado de surfistas, um entretém permanente.
Não era senão lógico que o hotel Fortaleza do Guincho fosse o meu favorito pela localização. Gil Fernandes, o chef executivo do hotel cujo restaurante tem uma estrela Michelin, é responsável que ele também seja o meu favorito pela comida. Lembro-me de ali ter feito várias refeições memoráveis, nomeadamente duas no tempo de Vincent Farges: um almoço da Academia Portuguesa de Gastronomia e um jantar de citrinos, em parceria com a quinta do Olhar Feliz, de Anne e Jean-Paul Brigand. Gil Fernandes herdou pesada carga emocional e uma estrela Michelin, que tem renovado com todo o mérito.
Agora que a diretora Petra Sauer, uma mulher encantadora e excelente profissional, teve a brilhante ideia de abrir uma esplanada no lado sul do hotel, abrigado da nortada, o SPOT, há mais uma razão de peso para frequentar o local. A ementa está muito bem conseguida, cobrindo um vasto espectro de gostos. Há pratos que podem ser partilhados, mas a ideia é mesmo incorporar o circundante mar na ementa. Nela se incorporam diversas plantas apanhadas na vizinhança, como o a planta-do-caril ou o funcho do mar. Os preços são muito competitivos em relação a outros restaurantes do Guincho e a qualidade ao mais alto nível. Aqui faz-se cozinha com os produtos do mar, mas sem os desvirtuar, antes os sublimando. Um almoço no SPOT é uma fonte de felicidade, que chega até a nós vinda da combinação da comida, do excelente serviço e da vista e eflúvios do mar. Aqui vos deixo as fotos do que já lá tive o prazer de comer e a minha recomendação para que experimentem, mesmo em dias de inverno, estação do ano em que o Guincho está no seu melhor.
As entradas que também podem ser pratos principais
O choco frito em versão delicada com bergamota e lima e uma maionese de sriracha (um molho à base de malaguetas, com vinagre, açúcar e outros condimentos).
O ceviche de peixe da costa com um piso de ervas, onde se salientam os coentros.
O pão e a broa feitos no local.
Não foi por acaso que está na capa do post. Este xerém de berbigão à Bulhão Pato rematado com barriga de porco fumada e crocante é um dos meus favoritos. Xerém feito com a farinha de milho na grossura ideal, berbigão, um dos meus bivalves favoritos e que ainda se pode comprar a preços muito razoáveis, e o crocante do porco a fazer o barulhinho no ouvido. Extraordinário.
Gostei muito deste vinho, que me acompanhou refeição fora. um bom preço, um prazer infinito que ecoa os aromas marinhos.
Os principais
A não perder, o lavagante com massa e um molho que representa a essência deste crustácio quelicerento.
A clássica combinação de um polvo tenríssimo com um bis de batata doce, em chips e em puré.
Primo muito afastado do bacalhau à Bràs, mas que mantém a delícia da cremosidade dos ovos onde se concentram as lascas do impecável bacalhau e vagueiam uns companheiros improváveis, os mexilhões carnudos, que se revelaram um casamento interessante. tudo perfumado pelo funcho do mar, o responsável pela identidade deste prato. Ah, e para repetir o casamento mar terra aqui volta a criatura porcina, desta feita na sua melhor transformação: o paio do cachaço.
Doçuras e travessuras
Esta sobremesa é imperdível: uma espécie de Snickers elevado a outra dimensão. o crocante do amendoim tem a textura perfeit, duro sem partir o dente nem se colar a ele, e uma equilibrada relação entre o chocolate, o caramelo e o amendoim.
A beleza e a frescura da framboesa, a presença material mas levíssima da amêndoa e, sobretudo, a perfeição do gelado de estragão. e o gelado vem em bola, como deve ser, porque os gelados são em bola, e não em quenelles. Ufa, até que enfim que alguém faz bolas de gelado.