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Conversas à Mesa

DOIS ARGENTINOS DESCOBREM PORTUGAL

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A Valeria e o Diego convidaram-me para almoçar hoje. Só os conhecia do Instagram (@thevankitechentrip), e pouco sabia deles. Por exemplo que são um casal argentino e vivem numa carrinha com a qual percorrem o nosso país à procura dos nossos melhores produtos artesanais. Adoram Portugal, que descobriram há cerca de um ano. Que têm sempre umas publicações maravilhosas com os nossos queijos, azeites, vinhos, enchidos e bolos. Aceitei o convite e pus-me a caminho do local onde a van estava estacionada, algures à beira-Tejo, munida do meu adorado GPS que me levou direitinha à porta da carrinha, onde já me esperavam os dois. Imediatamente entraram no meu coração e cá ficaram.

A primeira coisa que fizeram foi mostrar-me o interior da sua van/casa, o sonho de todo aquele que sonha com o despojamento total. Em 16 m2 está a vida toda deles, desde que venderam o seu apartamento na Argentina para comprar este veículo que hoje é sua casa sobre rodas que dá dez a zero aqueles pequenos apartamentos de 20 m2 que sempre me encantam no Ikea.

Ao fundo a cama, sob a qual guardam as coisas maiores. Dos lados, pequenos armários para roupa e um guarda vestidos de largura igual aos dos CD (ainda há pouco eram tão modernos...), onde Diego pendura cuidadosamente as camisas. Caminhando novamente para a entrada, está a casa de banho do lado esquerdo (poupar água é uma prioridade, já que o depósito só tem 90 litros) e do lado direito a cozinha. Uma placa vitrocerâmica, um lava-loiças e a pièce de résistence, um luxuoso forno finlandês com uma lindíssima pega em madeira que trabalha com gasóleo do depósito da carrinha. Depois a porta e do outro lado um pequeno armário. As cadeiras do condutor e do pendura rodam e envolvem uma mesa desmontável impecavelmente atoalhada e bem posta. Sentamo-nos à mesa, eu no lugar do pendura, e magicamente começam a aparecer coisas vindas de locais que me escapam completamente. A cadeira dobrável onde se vai sentar o Diego. Tripés para fotografar. Livros que me querem mostrar. Garrafas de vinho, presunto, amêndoas, presunto de porco alentejano e salada de tomate vão para a mesa. Do forno sai uma rescendente pastilla à marroquina, folhas de finíssima massa filo recheada de frango e ras-el-hanout. Uma delícia. Brindamos a Portugal, que segundo eles tem que se afirmar como marca.

 

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Valeria e Diego querem mostrar ao mundo as delícias que essa marca Portugal esconde por todo o país e que reuniram sob a forma de cabaz de Natal: queijos Ladoeiro da Beira Baixa, azeite do Alentejo, conservas de peixe Júpiter e Good Boy, Flor de Sal Salmarim, manteiga de amendoim Alcagoita, amêndoas cobertas de Moncorvo, presunto Cravinho, compotas MYG de Mértola,  vinagre de figo Fateixa, vinho do alto Tâmega, e muito mais, tudo de pequenos produtores. Até a cesta de vime é feita por cá. Para quem esteja interessado nesta fantástica oferta de Natal, é ir ao Instagram deles @the vankitchentrip e mandar mensagem privada.

O que eles precisam é de uma ajuda a nível de patrocínios institucionais ou privados para poderem mostrar ao mundo todas estas nossas maravilhas. Às vezes, um olhar de fora é necessário.

 

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Á PROCURA DO MELHOR DOCE DE OVOS EM AVEIRO

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Aveiro é a terra dos ovos moles, que até têm um monumneto em sua honra. Encapsulados em etéreos moldes de folha de obreia com formas marítimas inspiradas nos ofícios locais, gemas e açúcar em ponto formam uma massa homogénea de linda cor amarela.  A importância dos ovos moles em Aveiro vem dos tempo dos conventos existentes na cidade, nomeadamente o Mosteiro de Jesus da ordem Dominicana feminina. A junção da massa de ovos moles à folha de obreia, resultante da junção de apenas farinha e água, de onde eram recortadas as hóstias a comunhão foi mais que natural.

Os ovos moles eram também uma forma de conservação das gemas, uma proteína rica em gordura muito estimável. Quanto mais puxado era o ponto, mais tempos se conservavam, chegando de boa saúde até à Índia.

Mas o que me traz aqui hoje não é a história, mas sim uma ajuda na escolha dos ovos moles, caso vão a Aveiro (não imagino que seja possível ir a Aveiro sem os provar e trazer na bagagem). Se ficarem almareados com tanto ovo mole, o meu conselho é que bebam água um pouco frio e isso passa. Antes de começar, convém dizer-vos que os três ovos moles que provei eram todos de excelente qualidade, embora um deles tenha sido o meu vencedor.

Estive esta semana 3 dias em Aveiro, e provei ovos moles de três locais diferentes: A Confeitaria Peixinho, a mais antiga, fundada em 1856 (Rua de Coimbra 9, 3810-086), A Casa dos Ovos Moles (Rua João Mendonça, 225), de 1923, e a Casa Maria da Apresentação da Cruz, que funciona numa garagem da Rua D. Jorge de Lencastre 37, de 1882.
Já percebemos que o recheio dos ovos moles consiste numa calda de açúcar em ponto à qual se juntam gemas muito frescas. Esta massa é introduzida nuns moldes de folha de obreia previamente pinceladas com água, geralmente com formas marinhas (conchas, peixes, amêijoas, búzios). Estes moldes são posteriormente pincelados com uma calda de açúcar muito leve.

Desta forma, os meus critérios para avaliação dos ovos moles foram 4, cobrindo toda a confecção – cor, textura e ponto de açúcar da massa, textura da hóstia, beleza do molde de hóstia e perfeição do acabamento com a calda de açúcar.

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Ao comparar o Peixinho e a Casa Maria da Anunciação (à direita) é visível a diferença no uso da calda no acabamento da obreia. 

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O recheio da Peixinho, em baixo tem linda cor, é homogéneo e a calda não está demasiado puxada. o de cima, da Casa Maria da Anunciação tem recheio mais alaranjado (a cor deverá sempre ser da diferença das gemas e nunca de elementos exógenos colorantes) e tem calda mais puxada.

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A barrica da casa dos ovos moles apresentava alguns defeitos de cabamento (não visíveis na foto) e obreia mole. 

 

Em relação ao aspecto final, que inclui o beleza do molde e a perfeição do acabamento da calda de açúcar, o vencedor foi a Confeitaria Peixinho: molde perfeito, sem partes rotas ou partidas e com forma bem visível nas estrias, por exemplo. Na concha da Casa Maria da Apresentação havia má distribuição da calda e açúcar a mais. Este excesso de calda tornava o conjunto demasiado doce. A barrica da Casa dos Ovos Moles tinha ranhuras e não apresentava acabamento perfeito. Além disso a textura da hóstia era demasiado mole.

Em relação ao recheio, o meu ponto preferido foi também o da Casa Peixinho, com recheio homogéneo, aveludado e perfeito. As outras duas casas apresentavam ovos moles com ponto demasiado puxado (sobretudo na Casa Maria da Anunciação), perdendo a massa o aspecto aveludado.

Quanto a embalagem, as caixas do Peixinho, em tons pastel semelhantes à da parisiense La Durée, deram dez a zero às outras.

Vencedor absoluto em todas as categorias, Casa Peixinho. No entanto, os três ovos moles provados eram todos muito bons. Vale a pena lá ir só para ver a maravilhosa e recente decoração. Infelizmente está encerrada a casa de chá no primeiro andar. Além de ovos moles, tem bolo rei, raivas, moliceiros e barricas de ovos moles, e mais doçaria. O revamping da loja resultou da associação de Alberto Peixinho, o dono da confeitaria, com António Quaresma, o homem de Seia que criou o pastel de bacalhau com queijo, as latas de sardinhas com as datas e o Museu da Cerveja. Em breve quer trazer a Peixinho para Lisboa, certamente para o Terreiro do Paço quase todo dominado pelas suas lojas.

 

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A Garagem da Casa Maria da Anunciação

 

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Aspectos da Confeitaria Peixinho

 

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