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Conversas à Mesa

A ABÓBORA QUE VIROU PUMPKIN

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Por cá, o Starbucks transformou a abóbora em pumpkin, e nós transformámos o dia dos mortos em Halloween. Rapidamente nos desfizemos do pão por Deus (que horror, admitir que alguém pede pão em vez de guloseimas) para imitarmos os norte-americanos. E até aderimos ao pumpkin. Já nos estou a ver a produzir as tartes de abóbora em massa, vendo-nos livres dos nossos doces tradicionais, como os sonhos, os bilharacos ou as filhoses.

Nos EUA deitam-se fora 22 milhões de abóboras no Halloween, na Grã-Bretanha mais de 10 milhões. Além do desperdício alimentar, há o problema de uma quantidade massiva de lixo. Para agravar o problema, estas abóboras são criadas nesta época exclusivamente para decoração, sem qualquer cuidado com o sabor e a qualidade, pelo que mesmo que as quisesse consumir, provavelmente iria ficar desapontado com o sabor. Por outro lado, e a abóbora for talhada, poderá estar contaminada no fim das festas.

Será que nós portugueses que vivemos sem aloínes até há meia dúzia de anos, temos mesmo de aderir a esta tradição aglo-saxónica que os ianques banalizaram? Todos os povos têm este tipo de festas que lidam com a morte e o sobrenatural nesta época, por exemplo o dia dos mortos, mas não podemos conservar as nossas tradições?

Numa época em que a sustentabilidade está na boca de todos, era bom que atinássemos. E que continuássemos a ter abóboras em vez de pumpkins.

O PECADO MORA EM ODIVELAS

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Onde a Luisinha estiver a cozinhar eu estou a comer. Admiro-a como pessoa e como chef e gosto muito dela nas duas vertentes. É das poucas pessoas que eu conheço em que aquela história de cozinhar com amor não é cliché. Cada prato que sai das mãos dela alimenta-nos verdadeiramente a alma, o corpo e o palato. A Luisinha tem uma história de vida do caraças. Ela era enfermeira instrumentista num hospital de Lisboa até que, por voltas do mundo, decidiu sair de Portugal e emigrou para Nova Iorque, sem sequer falar inglês. Quando lá chegou, bateu à porta de vários restaurantes portugueses e arranjou trabalho depois de muitas peripécias. Conta ela, com muita graça, várias histórias dessa época que, nos primeiros tempos envolvem geralmente confusões linguísticas. O que é certo é que foi subindo sempre na qualidade dos restaurantes em que trabalhou, tendo chegado a chef do Robert, um ótimo restaurante em Colombus Circle. Há alguns anos, morta de saudades da pátria, decidiu sair do Robert e regressar, a fim de iniciar um projeto ligado ao peixe, o Peixe na Avenida, situado numa perpendicular à Av. da Liberdade. Ali provei um incrível e original cozido feito com peixe, com os enchidos à base de moluscos. O seu último projeto foi um restaurante em S. Jorge, nos Açores. Agora, a chef está a desenvolver um conceito italo-luso, um restaurante de comida italiana casada com a nossa tradição e os nossos produtos. As pizas, com um forno super, são maravilhosas, mas há uma série de pratos típicos de várias regiões de Itália que a Chef combina magistralmente com os sabores portugueses, nomeadamente os peixinhos fritos (Filetes de sardinha, completamente despinhados, com risotto de tomate), os brodi, ou caldos (Um caldo do cozido onde surge um ravioli com os sabores integrais deste prato, um prodígio de síntese) e os ragus (ragu de borrego de leite com pappardelle e hortelã, com o borrego de temperos bem nossos a casas com as largas fitas de massa).

A versão Luisinha do pato com laranja e a burrata com tomatada morna foram os meus favoritos. O primeiro surge sob a forma de perna sobre um risotto de laranja e com uma marmelada de laranja e cebola. O meu conselho: peça para desfiarem o pato e para transformarem a pele nuns pequenos torresmos. Mas não perca. Para começar, o pão de alho com massa de pizza é imperdível. Quando chegou à mesa e comi a primeira fatia, não conseguia parar.

A burrata de ótima qualidade abre-se para mostrar os fios de mozarela rodeados pela nata do leite. A sua frialdade contrasta com a tepidez do tomate cozinhado. Come-se tudo com um gnocco frito, uma espécie de pastel de massa tenra vazio por dentro. Este prato só por si justificava um desvio de muitos, muitos quilómetros, para vos falar em língua Michelin. (foto de capa: Burrata, molho de tomate e gnocco frito) 

Deliciosa a massa negra com tinta de choco acompanhada do próprio choco em tirinhas.

 

Para acabar, se conseguir, peque pela última vez à sobremesa com um conjunto quase exaustivo das melhores gulodices, mas já aviso que a redenção apenas será alcançada com muita penitência, envolvendo grandes percursos de joelhos e até flagelação A Luisinha consegue juntar no copo do Peccatum (assim se chama e é dos capitais) camadas de biscoito, creme de queijo mascarpone, gelado de baunilh, chocolate com avelã, caramelo e um café expresso. Caramba.

 

Para terminar, duas cerejas no topo do bolo: o restaurante é bonito e muito boa a relação preço qualidade, com o prato mais caro a 13,50 euros. E há especiais aos domingo à noite e preços para famílias. Recomendo com grande entusiasmo.

 

Fotos do Mário Cerdeira, o meu obrigada

DEVINA PECATUM 

 R. José Gomes Monteiro 136, 2675-397 Odivelas

Tel: 924 111 402

https://restaurante-pizzaria-devina-peccatum.negocio.site/

Têm takeaway

 

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 A Chef Luisinha, de seu nome Maria Luísa Fernandes

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Pão de alho 

 

 

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Pizza Parma 

 

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Risotto de tomate, Filetes de sardinha fresca 

 

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Esparguete negro e choco salteado em azeite, alho, limão e coentros 

 

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Ravioli de cozido à portuguesa em caldo do cozido, cenoura, couve-lombarda e hortelã 

 

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Risotto de laranja com pato confitado, pele em torresmo e marmelada de cebola 

 

 

 

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Ragu de Borrego de leite com Papardelle e hortelã 




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Peccatum


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A refeição foi acompanhada com vinhos da Pacheca. Este tinto brilhou.





 

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