POSTAIS DO BARROSO
https://youtube.com/shorts/hLUHwysmex4?si=QBe3Mq3jX-AzmAtf
Faz agora 13 anos andava eu com o Mário Cerdeira pelo Barroso, a recolher material para o livro Sabores do Ar e do Fogo, uma edição dos CTT. todos os livros que fiz tinham sempre duas componentes: uma de campo e outra de secretária (hemeroteca e biblioteca, internet, secretária).
Gado barrosão
Com o Mário Cerdeira em viagem.
Almoço dos CTT locais com José Quitério
Com um homem extraordinário e sabedor do Alentejo que me ajudou muito: o Eng Tirapicos.
Outro homem que foi essencial para o livro e que sabe imenso: o Jose Júlio Vintém.
A viagem ao Barroso fez parte de uma investigação de 2 anos pelo país todo, sempre com o Mário Cerdeira, e às vezes com o José Quitério, que coordenava a edição e que aproveitava para visitar restaurantes pelo caminho para a crónica do Expresso. No fim desses dois anos eu cheirava permanentemente a fumeiro.
Aprendi muito no terreno. Em todo o país, as pessoas ajudaram-me imenso com as suas histórias e as provas das suas chouriças. Explicaram-me o processo todo, que acompanhei com a maior curiosidade. De Trás-os-Montes ao Algarve, só encontrei simpatia.
Mas aprendi também que nem sempre o artesanal é bom. No Barroso estive em fumeiros alimentados a tábuas de construção cheias de tinta. Imaginem o tipo de fumo… E aprendi que o importante no artesanal é o tempo, a variável mais escassa do universo. É o tempo, que juntamente com os saberes, permite obter enchidos de grande qualidade. Quando alguém se apressa para fazer uma entrega de salpicões e os sujeita a demasiado calor na fumagem, ficam crus por dentro e com uma rodela preta no exterior. Um dó.
E aprendi ainda que os produtos industriais podem ter imensa qualidade. Como foi o caso da SEL, no Alentejo, que faz ótimos enchidos de porco de raça alentejana. Lembro-me de que o fundador da SEL, o Sr Francisco Arvana, inventou uma máquina de picar cebola que não a desfaz e imita a mão humana, a fim de melhor a qualidade de um determinado enchido. A nossa indústria familiar tem pessoas extraordinárias como o Sr. Arvana que querem produzir qualidade constante e sustentável.
Numa das nossas idas a Trás-os-Montes ficámos a dormir em Chaves, numa pensão modernizada. Durante a noite estiveram -4 graus e o meu aquecedor estava avariado, e ninguém na recepção. Vesti toda a roupa que tinha trazido no saco e mesmo com 3 pares de peúgas e 3 camisolas não consegui dormir. Tanto o Mário como o Zé Quitério dormiram quentinhos.
Tinha começado nessa altura o uso do GPS e o Mário vinha provido dessa orientação que muita falta fazia uma vez que os locais de que andávamos à procura eram minúsculas aldeias ou até casas solitárias sem rua nem número de porta. Acontecia falharmos a viragem ou o GPS não ter aquela indicação e irmos parar a outros lados. O Zé Quitério, que detestava tudo quanto era digital (sempre escreveu tudo à máquina, nunca interagiu com um computador nem nunca teve telemóvel) zangava-se à brava com o Mário e perguntava onde estavam os mapas em papel com os quais íamos a todo lado. E foi assim a viagem toda.
Os almoços faziam-se sempre longos. Lembro-me em particular de um, em Pitões de Júnias, para o qual eu tinha convidado um engenheiro da associação dos criadores de porcos. Fez um bonding com o Zé Quitério e ficaram a comer o cozido local feito com carnes fumadas até quase a hora do jantar. Eu e o Mário tínhamos compromissos ao longo da tarde toda em diversos fumeiros mas lá ficámos também a confraternizar.
Cada livro que escrevi tem isto: na base da escrita está uma longa viagem, recheada de experiências únicas que enriqueceram a minha vida. Hei-de contar-vos outras histórias, se assim vos apetecer lê-las. Entretanto deixo-vos imagens da viagem ao Barroso.
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