Estreia da lampreia
Ou se adora ou se odeia. Conheço muito boa gente de fino gosto que nem vê-la. Eu pessoalmente gosto muito. Uma das razões desse amor talvez esteja na sazonalidade. Tenho paixão por comer produtos e pratos sujeitos às leis da época, e a lampreia, juntamente com as sardinhas e o sável, é um dos poucos habitants marinhos de que conhecemos a época.
Hoje abri a época da lampreia. Foi no Beira-mar, em Cascais, e reponsáveis pela boa companhia e melhor coversa foram, entre outros, os donos da casa e o Raul Moreira.
A estreia não podia ter sido melhor. Dois pratos de lampreia típicos da Galiza baseados no ciclóstomo levemente fumado, durante cerca de dois dias. Num deles, a lampreia é enrolada em torno de ovos cozidos e cortada em finíssimas fatias. A combinação da cremosidade e da doçura dos ovos faz frente à textura e ao sabor fumado da bicha, resultando um pitéu que sabe bem comido à mão. No outro, a lampreia foi cortada em pedacinhos minúsculos depois de grelhada, sendo servida com cebola crua em lascas. Estava magnífico esta segunda opção.
Para rematar, um belíssimo arroz feito com o respective sangue e o verde tinto na cozinha do Beira-mar. Muito equilibrada, apenas com a acidez que lhe é dada pelo verde, rematou com muito garbo a trilogia ciclostómica.
A acompanhar as várias lampreias bebeu-se um Paço dos Cunhas de Santar, branco de 2005 e um Baga 1991 Marquês de Marialva (Bairrada). Ambos magníficos.
Para rematar, uma rabanada e uma aguardente aromatizada com ervas da Galiza.
(As lampreias foram capturadas com estacada: uma rede vertical ao leito do rio que é segurada por estacas que vão desde o fundo até à superfície (daí o nome). As medidas da rede estão regulamentadas (comprimento máximo de 50 metros e malha mínima de 6 cm).