MIGUEL LAFFAN NO PALMA
O novo restaurante do hotel Torre de Palma chama-se Palma e é chefiado por Miguel Laffan. Este chef já esteve cerca de 9 anos no Alentejo, no L’And and Vineyards, onde fez um trabalho incrível que lhe valeu a estrela Michelin. Embora no L’And a cozinha fosse de fine dining, Miguel aprendeu aqui a conhecer o Alentejo. Regressado, está a fazer no Palma uma cozinha a que eu chamaria de felicidade. Apoiado em produtos da região, Miguel tem um conceito central: fazer pratos com matriz portuguesa e alentejana onde se nota a sua mão, onde perpassa a sua identidade, mas apenas o suficiente para os tornar mehores. Não é a originalidade que procura, mas sim a sua optimização. Vejamos o caso dos ovos rotos, um prato que também se faz muito do lado de cá da raia. Miguel fá-los num carrinho, à nossa vista. Começa por saltear produtos locais, como enchidos, espargos verdes e cogumelos e isso faz toda a diferença. O prato resulta delicioso e enriquecido, mas continuam a ser ovos rotos completamente reconhecíveis. Ou o caso do croquete. É feito de borrego merino local e tem um sabor diferente e quente, um tempero de especiarias que quem conhece a cozinha do Miguel percebe de imediato.
Croquete de borrego
Gambas fritas
Miguel Laffan faz ovos rotos à mesa
Queijo de ovelha gratinado
Rissol de lavagante
Empada de pato
Para entrar, além dos ovos rotos e dos croquetes, há também uns rissóis de lavagante e um queijo de ovelha gratinado no forno com orégãos e um chutney de pimentos que nos faz rapar a tigela até aos últimos pedacinhos, aqueles que ficam agarrados e que são os melhores. Os camarões com alho, chili e coentros frescos são isso mesmo, mas estão na cozedura perfeita e têm o equilíbrio de temperos ideal. Mas se só pudesse comer uma entrada, não tinha dúvida em escolher a tarte de pato, um pequeno domo de massa perfeita que encerra um recheio de pato assado no forno a lenha. A saborear devagarinho.
Cação de coentrada
Para prato principal, escolheria o pernil de borrego lentamente assado, a carne a desprender-se dos ossos, o sabor a ervas do campo, com as batatinhas assadas com chalotas e os espinafres a refrescarem. Ao lado, um molho à francesa (um demi-glace muito leve e fresco). Para alegrar, o borrego vem no carrinho e é trinchado à vista. Faz toda a diferença.
O cação de coentrada vem em lascas com o toque de vinagre de que eu gosto; a sentir-se mas sem obnubilar o resto.
Para provar, veio ainda um prato que eu chamaria vintage: Miguel Laffan consegue pegar no nosso famoso bife das cervejarias (Trindade, por exemplo), que tem aquele molho branco e enfarinhado e transformá-lo numa preciosidade. O aspecto recorda-nos o bife cervejeiro, mas, num incrível tour de force, o molho, feito sem qualquer adição de farináceos, e a qualidade da carne (e das batatas cortadas à mão com aquelas extremidades mais finas que ficam ainda mais crocantes) elevam o prato todo ao paraíso dos bifes. Espero que passe a ter presença definitiva na carta.
De sobremesa, farófias com gelado e crocante de avelãs (não me causou grande emoção) e uma belíssima versão de mousse de chocolate sob forma de rolo com caramelo e um gelado de manteiga de amendoim. Belíssima conjugação de diferentes texturas, macias e crocantes, com a adição do caramelo que é sempre um bom companheiro. A minha escolha vai para a tartelette de maçã assada com gelado de baunilha e creme diplomate.
Tudo regado com os bons vinhos da adega de Torre de Palma.
Farófias e avelãs
O chocolate e o caramelo salgado
Quem esteja pelo Alto Alentejo, vá experimentar o Palma. Há quanto tempo eu tinha desejo de que houvesse assim um restaurante, em que, sem twists mas com muita personalidade, ingredientes de grande qualidade e técnicas imaculadas, se pudessem comer bons pratos tradicionais. E onde o objectivo principal fosse a felicidade do comensal e não a exibição de talentos do chef.
Nota: este post resultou de 2 jantares. Beberam-se vinhos de Torre de Palma.