Viajando nos Açores
Antes de mais, uma boa notícia: vai poder saborear a gastronomia dos Açores em Lisboa. De 18 a 27 de Fevereiro, as ilhas são convidadas do restaurante Terraço, Tivoli da Avenida da Liberdade, evento integrado no Portugal de Norte a Sul, de que sou organizadora. As ilhas estarão representadas pelo restaurante Anfiteatro, da Escola de Formação Turística e Hoteleira de Ponta Delgada, com os chefs Sandro Meireles, Pedro Oliveira, Cláudio Pontes e Nuno Santos.
Para vos abrir o apetite para a magnífica gastronomia açoriana (que varia bastante de ilha para ilha) deixo-vos aqui um roteiro da ilha de São Miguel, porque tenho a certeza de que, depois a provar no Tivoli, irão querer conhecê-la in loco.
Já há mais de vinte anos que não ia aos Açores, nomeadamente à micaelense Ponta Delgada. Recordava-me de uma natureza belíssima, luxuriante e de um centro histórico riquíssimo. Mas desta vez o que mais me impressionou foi ter achado um ambiente tropical na ilha. Não é apenas a vegetação que cresce à custa da elevada humidade, é a semelhança das casas, dos restaurantes, dos impérios, das cargas de água que caem de repente. Tanta coisa que me lembra por vezes o Brasil, por vezes África, mas uns trópicos arrumados, limpos, organizados, uma espécie de trópicos «suíços».
Um tour gastronómico de São Miguel
VISITAS ESSENCIAIS
Proponho-vos aqui meia dúzia de visitas, todas elas perto de Ponta Delgada e que podem ser combinadas ao longo de um dia. Para melhor compreensão, estão todas localizadas no mapa. Tudo é muito perto e as estradas são óptimas.
O Sr. Vítor vende aqui os araçás vermelhos e amarelos das suas árvores.
Os minhotes são os inhames mais pequenos (à esquerda)
A moreia salta-nos à vista,
mas é o peixe-cão quem nos enche o olho.
Até as plântulas são um prazer para a vista, vestidas para agradar.
O mercado de Ponta Delgada
É uma visita curiosa e pedagógica, mas sobretudo vibrante de cor. É delicioso ver tanto produto da época reunido numa pequena superfície. As bancas de peixe estão mais ou menos recheadas em função da época e do tempo que faz. São uma boa forma de perceber a tropicalidade das ilhas através da presença de vários peixes multicoloridos, como o lindíssimo e saboroso peixe-cão e o bodião. Nas bancas de legumes, reinam as caprichosas formas do inhame, o araçá (óptimo para doces e sumos), o omnipresente ananás e o maracujá. O Sr. Vítor, que tem banca logo na entrada principal, vende polpa de araçá e de maracujá congelada por encomenda. O maracujá açoriano tem um perfume e um sabor do outro mundo. Mas repare também nos citrinos, se for de inverno: o limão-galego, por exemplo. À saída não falhe a loja de O Rei dos Queijos. O meu conselho? Queijo Morro, do Faial, sobretudo em versão mini (como o Azeitão), queijo de São Jorge o mais curado que encontrar, bolos lêvedos, biscoitos de cerveja, malassadas (se estiverem acabadas de fazer). Os meus sacos vieram carregados de pimenta-da-terra sob todas as formas, sobretudo de conserva em vinagre.
O porto de Rabo de Peixe
Em cima, a obra de Vihls, em baixo outras duas intervenções
A Quinta dos Sabores (1)
A não perder a Quinta dos Sabores, ou oficina agroalimentar, de Paulo Decq, perto de Rabo de peixe. A ideia é marcar um almoço no pequeno restaurante da quinta onde pode desfrutar dos produtos biológicos e lançar o desafio ao Paulo para lhe mostrar as plantas todas. A quinta, que já foi um enorme pomar de laranjas, tem um ar completamente selvagem, mas Paulo conhece cada plantinha, por muito incipiente que seja. Quando passar em Rabo de Peixe (2), aproveite para ver os grafitti/retratos/esculturas de caras de gentes locais feitas pelo português Vihls, que tem obra um pouco por todo o mundo.
O simpático Sr. Adelino nas suas instalações, as formas das queijadas e as mesmas.
As queijadas de Vila Franca do Campo (3)
A ida a Vila Franca do Campo, As queijadas Morgado, para comer duas queijadas (o mínimo...), dar dois dedos de conversa ao Sr. Adelino, o proprietário, é fundamental. As queijadas têm recheio fino, com suave sabor a queijo, e uma casquinha de extraordinária finura, mas com presença. Vendem-se em caixinhas de 6, ideais para presentear quem ficou no Continente.
A massa sovada (4)
Depois é passar em Ponta Garça, na Dona Isabel que, com as duas filhas, faz uma massa sovada, amassada à mão e cozida em forno de lenha. Vende-se em bolos grandes que, cortados em fatias e torrados (ou não) são uma base deliciosa para um doce de araçá ou para puxar a um licor de maracujá.
Uma das salas da produção de chá (em cima) e a mesma sala com a mesa posta para um jantar de degustação (Projecto Às Cegas, promovido pelo restaurante Anfiteatro, da EFTH).
As plantações de chá
Os chás da Gorreana (5)
A plantação e a localização são de ficar de boca aberta. A fábrica é curiosa porque não é apenas artesanal, parou no século XIX, perto da Revolução Industrial, mais precisamenye em 1883, data da fundação. Apesar de as instalações (bar, WC) estarem muito velhas, a fábrica tem muito potencial. Uma mudança no visual da marca seria muito aconselhável, mas penso que a nova geração que dirige a empresa há pouco tempo (duas jovens senhoras), já está a proceder a essas mudanças. Vende-se chá preto e verde, bergamota e jasmim.
Um jantar de degustação (Projecto Às Cegas, promovido pelo restaurante Anfiteatro, da EFTH) numa estufa de ananases da Arruda
Os ananases (6)
Hoje é o primeiro produto que associamos ao arquipélago, embora o ananás só tenha sugido nos Açores no século XIX, a fim de compensar o desastre do antiquíssimo cultivo da laranja, atingida pela gomosa, doença fatal. O seu cultivo foi incentivado pela família Bensaúde, que criou as primeiras estufas em vidro. É uma visita obrigatória e interessante, até sob o ponto de vista estético. As estufas são lindas, assim como a planta, que ficamos a conhecer em várias fases de desenvolvimento, e certas peculiaridades do seu cultivo. É importante que haja um guia, falante ou escrito, que nos permita apreciar a visita na sua plenitude. Eu visitei as Plantações de ananases A. Arruda, que têm o bónus de uma interessante loja de produtos e artesanato açorianos.